Por Frederico Cortez
Numa democracia plena, todos os questionamentos, indagações e discordâncias devem pautar-se no diálogo, que em muitas vezes são admitidos em altas temperaturas. No entanto, a liberdade de expressão encontra-se obstaculizada quando ultrapassa o limite do tema em debate e transita para os ataques pessoais/institucionais. Até mesmo a ameaça, sem a materialização da vontade é crime em nossa sistemática jurídica nacional.
A Constituição Federal é muito clara e inconteste em seu art. 5º, IV, quando entabula que “é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;”. Assim, não há que confundir-se a “liberdade” com o “totalitário” ao se expressar. Este último traz a ausência de limitação em suas linhas, assim acarretando um desequilíbrio. De bom grado lembrar que um dos símbolo da justiça é a balança, que tem o tratamento igualitário em seu conceito.
De certo que nossa justiça brasileira não é perfeita e estar longe de ser a ideal, mas ainda bem que a temos! Senão, onde iríamos pleitear socorro em casos de ameaça ou grave lesão ao nosso direito (individual ou coletivo) ?
O filósofo grego Aristóteles, discípulo de Platão (Arístocles) e professor de Alexandre, o Grande, disse em sua obra “Ética a Nicômaco” (335 a.C. a 323 a.C.) que “A justiça é uma espécie de meio-termo, porém não no mesmo sentido que as outras virtudes, e sim porque se relaciona com uma quantia ou quantidade intermediária, enquanto a injustiça se relaciona com os extremos”.
Todo e qualquer extremismo nos leva à injustiça!
Na semana passada, o deputado federal Daniel Silveira (PSL-MG) foi preso por ordem do Supremo Tribunal Federal (STF) em razão de suas inúmeras ameaças, insinuações e acusações desprovidas de provas contra os ministros da Corte constitucional. Repise-se que, pode-se questionar, indagar e discordar, mas dentro da via eleita correta, legal e em sempre respeitando o Estado Democrático de Direito.
Tal parlamentar, em nenhum momento lança mão de argumentos técnicos legislativos e/ou jurídicos para contrapor-se às decisões dos membros do Supremo. Pelo contrário, são palavras e frases contextualizadas em crimes já tipificados no Código de Processo Penal brasileiro. Se a indignação for contra o inquérito das fake news instalado pelo próprio STF, sob o argumento de que o julgador não pode ser o acusador concomitantemente, que se busque a via escorreita dentro do devido processo legal em nosso ordenamento jurídico.
Aliás, Daniel Silveira perdeu uma ótima oportunidade de levar todas essas questões para o plenário do próprio Poder Legislativo, o qual faz parte até o momento. Ali, é o verdadeiro palco de confrontações de pensamentos e de posicionamentos sobre a formação de uma nova legislação ou acerca da reforma de uma lei já em vigor em nosso País.
Fato é que o Brasil já vem carregando a sombra do extremismo já há algum tempo, seja de cunho da política da esquerda ou da direita. Esse tensionamento, por parte de alguns representantes do povo brasileiro no Congresso Nacional, não contribui em nada para a construção de uma nação próspera. O parlamento é o ambiente para formação de leis e não de fabricação do ódio e/ou de disseminação de atos contra a ordem pública social.
Dentro do ambiente jurídico, o magistral doutrinador e jurista brasileiro Miguel Reale destaca no seu livro “Teoria Tridimensional do Direito” (1940) que o Direito é formado por três concepções, quais sejam: Sociológica (fatos e à eficácia do direito); Axiológica (valores e aos fundamentos do direito); e Normativa (normas e à vigência do direito).
Na votação realizada na Câmara dos Deputados na última sexta-feira, 19, para fins de confirmar a decisão cautelar da prisão do STF contra o deputado federal ou denegar os seus efeitos, 364 parlamentares daquela casa votaram pela permanência da decisão do Supremo. De outro lado, 130 deputados federais votaram contra a ordem de prisão sob o argumento de que o STF estaria invadindo a competência da casa legislativa. Aqui, evidencia-se que a reprovação moral (valor axiológico) superou a norma legal em seu stricto sensu.
Na literatura do STF há inúmeros julgados sobre a constitucionalidade da limitação no poder de se expressar, não tendo assim o condão de chancelar o arbitrário e o ilícito. A pacificação na Corte constitucional sobre a temática é o Norte a se seguir por todos. Avalio.
A mens legis da Constituição Federal de 1988 não autoriza a ruptura da construção de uma sociedade livre, justa e solidária, objetivos esses fundamentais elencados no art. 3º, I da própria Lei Maior. O garantismo da liberdade de expressão e pensamento de uma sociedade civil organizada deve vir acompanhado das limitações e reservas imputadas a cada um de nós, onde se busca a preservação daquilo que nos é mais caro: a Democracia.