Por Frederico Cortez e Grabriel Brandão
Post convidado
Por muitos anos até então, um enorme abismo separava o formato de gestão dos clubes de futebol bem sucedido da União Europeia e dos Estados Unidos das agremiações brasileiras. Dívidas impagáveis com órgãos públicos, problemas de gerenciamento, falta de caixa para quitar até mesmo salários de jogadores faziam parte do cotidiano de grande parte dos times do brasil (pode-se concluir na sua totalidade). Isso tudo passou a mudar e temos agora uma luz no fim do túnel, com o advento da Sociedade Anônima de Futebol (SAF) instituída pela Lei 14.193/21.
De acordo com o marco legal dessa nova da Lei do Clube Empresa, a criação da SAF pode ser por três vias, sendo elas: (i) transformação do clube ou pessoa jurídica original em Sociedade Anônima do Futebol; (ii) cisão do departamento de futebol do clube ou pessoa jurídica original e transferência do seu patrimônio relacionado à atividade futebol; e (iii) pela iniciativa de pessoa natural ou jurídica ou de fundo de investimento. Este último ponto elencado no art. 2º, inciso III da Lei 14.193/21, já devev ser considerado um dos principais pontos positivos da SAF, justamente por ser uma medida socorrista à grave crise financeira que muitos clubes vem arrastando ao longo da última décadas.
Segundo um levantamento da empresa de marketing esportivo Sports Value, 20 dos principais clubes têm débitos acumulados entre R$ 500 milhões e R$ 1 bilhão entre dívidas fiscais e outras conas em atraso, entre os anos de 2019 e 2020. Um exemplo desse cenário caótico das nossas entidades desportivas, destacam-se o Cruzeiro e o Botafogo como membro desse grupo de endividados na casa de R$ 1 bi. Somente com a adesão do time do Cruzeiro ao sistema SAF, que foi possível o aporte de R$ 400 milhões pelo ex-jogador e empresário Ronaldo (fenômeno) no clube, o que correspondeu a 90% das ações do time mineiro.
A legislação da Sociedade Anônima de Futebol (SAF) teve o devido zelo em preservar a competitividade entre os seus clubes membros, ao vedar expressamente em seu art. 4º que “O acionista controlador da Sociedade Anônima do Futebol, individual ou integrante de acordo de controle, não poderá deter participação, direta ou indireta, em outra Sociedade Anônima do Futebol”. Outro ponto importante consta no parágrafo único da Lei 14.193/21, quando trata da inclusão dos atletas, membros da comissão técnica e funcionários nesse novo modal de gestão esportiva em relação à dívida trabalhista, mas desde que a atividade principal seja vinculada diretamente ao departamento de futebol.
Como se vê na referida legislação, o pano de fundo é a intenção, ao fim e ao cabo, de transformar as atuais associações desportivas de futebol em sociedades empresárias, oferecendo, em contrapartida, benefícios fiscais, possibilidade de recuperação judicial e extrajudicial, regime especial de administração, bem como a facilitação de quitação de débitos, inclusive com expressiva minoração de multa e juros e, em determinados casos, até de isenção completa de encargos legais, conforme se infere no artigo 9º e seguintes da Lei da SAF.
Nesse diapasão, e com o fito de profissionalizar o futebol brasileiro, a lei acima citada inova positivamente ao trazer regras claras que incentivam a transformação dos clubes em sociedades empresárias com um mínimo de governança corporativa responsável, transparência das receitas e nos gastos com a responsabilização de gestores, aumentando, assim, as chances de tornar os clubes em entidades organizadas e seguras no competitivo mercado desportivo nacional e internacional. O resultado é um só: atração de investidores e mais receita para o clube.
A legislação trazida na SAF é nova, porém a necessidade de se profissionalizar os times de futebol no Brasil é bastante antiga já. O que não se concebe mais é transferir toda a ingerência de clubes com suas dívidas impagáveis para a sociedade, sob a camuflagem de “renegociações” onde já temos bastante experiência que não serão cumpridas em seus termos ou por meio de “perdões”, cujo todo prejuízo será transferido para a sociedade pagar.
O mais importante é que essa ponte está em fase final de sua construção, porém ainda com muita cautela por partes dos clubes. Um dos principais obstáculos da SAF está na renúncia do sentimento de pertencimento, que parte diretiva das entidades desportivas ainda nutre sobre a sua agremiação desportiva. Resquício esse, do falido modelo de gestão operacional dos clubes brasileiros de futebol.
Até breve, com mais um artigo especial sobre a Sociedade Anônima de Futebol (SAF)!