Não faça política se você não consegue colocar os interesses maiores da sociedade acima de suas dores. O poeta alemão Bertold Brecht (meu comunista predileto) disse num poema escrito de dentro da noite sombria do nazismo: “Deita com o vil, se preciso for,/ mas muda o mundo/ porque o mundo precisa ser mudado”.
Não faça política se você não consegue colocar os interesses maiores da sociedade acima de suas dores, repito. Comparo as tristes figuras que agem assim a um narciso trajado de farrapos, a ostentar sua coroa de lata. Quando uma liderança age assim, ela nos está dizendo com todas as letras: eu não estou à altura do lugar onde vocês me colocaram.
Não. Não faça política se você não consegue colocar os interesses maiores da sociedade acima de suas dores. Foi ofendido e traído? Atingido por atos mesquinhos, preterido à margem do mérito? Você tem todo o direito de denunciar em viva voz o quanto lhe custou cada segundo exposto aos piores sentimentos de quem julgava aliados.
Mas, não. Não faça política se você não consegue colocar os interesses maiores da sociedade acima de suas dores. Porque você terá de fazer valer sua relevância de modo cruel, a um custo que poderá ser pago pelos mais vulneráveis. Sim, aqueles que você sempre defendeu é que irão pagar a conta do traje brilhante de sua vaidade com que você irá ao banquete dos covardes.
Citei Brecht e, para concluir, o cito novamente. Em uma peça de teatro sua, ambientada durante a guerra civil espanhola, a senhora Carrat se volta para um padre de sua vila, que mantinha uma neutralidade na luta entre democratas e fascistas, porque “seu reino não” era “deste mundo”, e diz: “Cuidado, padre. O senhor está lavando as mãos em sangue”.
Certamente, a senhora Carrat, como muitos que tiveram seus dias finais numa masmorra do fascismo franquista, concordaria comigo quando digo insistentemente: não faça política se você não consegue colocar os interesses maiores da sociedade acima de suas dores.