
A polarização política é um estado febril. Um convite para dançar com a insensatez a valsa da paixão que arrasta as massas para a arena política, mas, paradoxalmente, dificulta clareza de entendimento sobre os fatores que determinam o curso dos acontecimentos.
O teor acima, uma divagação introdutória, é mais uma vez constatado agora, quando laudatórios vaticínios se derramam na apreciação de resultados de pesquisas recentes (Quaest e Datafolha) sobre o desempenho do governo Lula. Ao vê-las, me faço a pergunta do poeta: “Quem lê tanta notícia?”
Enquanto os adversários forçam a versão precipitada de que a queda de aprovação do governo é a véspera do fracasso, alguns de seus aliados, abalados pelo quadro inesperado, regridem para um estado infantil, negacionista, e fazem a pior escolha de ver tal quadro apenas como episódio momentâneo.
Com isso, as crianças tomam a sala de assalto e se estreita o espaço para uma conversa mais adulta. Algumas pessoas me pediram uma avaliação própria e, confesso, bateu a preguiça de entrar nesse ambiente intelectualmente depauperado, cujos escombros exigem muito ânimo em sua remoção até que se recupere terreno para construir alguma ideia que possa oferecer utilidade.
Não me estenderei em termos conclusivos, porque é impróprio, mas há três aspectos que podem contribuir para uma interpretação menos rasa da realidade. Vamos lá.
Um. Não foi apenas a biosfera que aqueceu 1,5ºC em 2024: os humores da humanidade também. Há uma mutação em curso, de contornos não de todo definidos, mas que expressa evidência na dificuldade que têm enfrentado os governantes para obter êxito quando pretendem se reeleger. As sociedades ocidentais demonstram baixa tolerância com seus sistemas de representação em proporções mais inquietantes. Logo, há alguma coisa aí que não se deve exclusivamente a aspectos conjunturais.
Dois. Estão certos o que apontam a alta de preços dos bens de consumo como o gatilho nervoso na mudança de humor dos brasileiros quanto ao desempenho do governo, sim, mas há uma base de frustração mais ampla dando ponto de apoio à alavanca dessa insatisfação: o Lulismo envelheceu. Sua versão 3.0 mantém a conhecida habilidade do presidente em lidar com o quadro macroeconômico e as mumunhas fisiológicas de Brasília, mas traz à cena pouca inovação no seu mastro de bandeiras recicladas. Na percepção social em geral, Lula 3.0 é um “reformismo sem reforma”.
Três. O equívoco que, intencionalmente ou não, os adversários do presidente tentam alimentar é tomar os índices de uma pesquisa sobre o desempenho do governo como índices de projeção eleitoral para 2026. Em primeiro lugar, porque ainda estamos no início de 2025 e o jogo não está jogado.
Ademais, uma pesquisa de desempenho traz um dado absoluto sobre um quadro momentâneo, enquanto os resultados de uma pesquisa eleitoral agregam outros aspectos mais consolidados de imagem e ocupação de campos políticos e ideológicos mais sedimentados, sendo, ainda, a projeção de uma “compra comparada”, onde o outro polo contentor há de se mostrar capaz de absorver, ou não, as variadas insatisfações.
Um olhar retrospectivo sobre os últimos trinta e cinco anos ajudaria a constatar quão inseguros são os dados colhidos com tanto tempo de antecedência. Há muito frisson nisso tudo. Uma ânsia de antecipação que costuma apresentar conjecturas sem maior consistência. Enfim, muita calma nessa hora, minha gente: ainda estão rolando os dados.
