
Uma nova pesquisa do Vox Populi, encomendada pelo Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), mostra que carro, casa própria e celular formam hoje o top 3 de desejos da população. Educação e plano de saúde, que por mais de uma década figuravam entre as prioridades, saíram do pódio. O trabalho foi divulgado primiordialmente no O Globo. Detalhe: O entrevistado pode indicar mais de um item e, por isso, a soma supera os 100%.
Essa inversão de valores não é apenas um retrato sociológico: é também um termômetro eleitoral. Em um país onde líderes calibram seus discursos com base no humor das ruas, entender o que o brasileiro deseja é compreender o que, em breve, estará nos palanques.
📉 O novo ranking dos sonhos
| Posição | Desejo principal | % de menções | 
|---|---|---|
| 1º | Carro próprio | 62% | 
| 2º | Casa própria | 47% | 
| 3º | Celular | 37% | 
| 4º | Internet/Wi-fi | 31% | 
| 5º | Educação | 26% | 
| 6º | Computador/Notebook | 24% | 
| 7º | Plano de saúde | 19% | 
| 8º | Previdência privada | 16% | 
| 9º | Seguros | 14% | 
| 10º | Streaming (TV/música) | 13% | 
📍 Fonte: Vox Populi/IESS – agosto de 2025
(A soma ultrapassa 100% porque os entrevistados podiam escolher mais de um item.)
🚗 O carro volta a ser símbolo de ascensão
O dado que mais chama atenção: 62% dos brasileiros dizem sonhar com um carro próprio — superando, inclusive, a casa própria (47%).
Essa preferência sinaliza o impacto da mobilidade e do trabalho por aplicativo na vida cotidiana. Entre 2022 e 2024, o número de trabalhadores de apps cresceu 25,5%, segundo o IBGE.
Para essa nova classe de autônomos, o automóvel deixou de ser luxo para se tornar instrumento de sobrevivência e status social.
Mais que um bem material, o carro tornou-se símbolo de liberdade e renda imediata — valores que dialogam com o espírito individualista e digital da economia contemporânea.
📱 Celular: o novo passaporte da vida moderna
A ascensão do celular ao top 3 nacional confirma o Brasil hiperconectado.
Em 2024, 88,9% da população com 10 anos ou mais possuía um telefone móvel pessoal — o equivalente a 167,5 milhões de pessoas. E 88% usaram a internet no último ano.
O celular é, hoje, a ferramenta que dá acesso ao trabalho, à informação e à sociabilidade. É também o elo com o consumo e o entretenimento.
Nas camadas mais jovens e urbanas, o telefone se converteu em símbolo de pertencimento, poder e identidade — um “documento digital” de existência.
🎓 Educação perde prestígio — e isso preocupa
A queda da educação para o 5º lugar rompe um padrão histórico. Segundo a professora Andrea Serpa, da UFF, o fenômeno é resultado de uma erosão simbólica e ideológica:
“A educação foi atacada discursivamente, desqualificada por autoridades e influenciadores. Vendeu-se a ideia de que sucesso é mentalidade, não aprendizado. O resultado é uma geração que vê a escola como irrelevante.”
O diagnóstico é duplo:
- 
Ataque institucional — desvalorização do magistério e descrédito das universidades.
 - 
Cultura digital imediatista — o sucesso exibido nas redes como atalho, não consequência.
 
O efeito político disso é profundo: uma juventude que desacredita no mérito educacional tende a desacreditar também na política como via de ascensão.
💊 Planos de saúde fora do alcance
O plano de saúde caiu da 3ª para a 7ª posição.
Segundo José Cechin, superintendente do IESS, o motivo é econômico:
“O preço se tornou inatingível para a maioria. Quando o custo cresce, o sonho desaparece.”
Atualmente, 66% dos planos empresariais exigem coparticipação do trabalhador — o que transforma o benefício em um fardo financeiro. Além disso, a judicialização e o avanço tecnológico pressionam custos e reajustes. Resultado: o brasileiro continua valorizando o plano de saúde, mas deixa de sonhar com ele.
🧩 O pano de fundo político
Essa mudança de prioridades deve reorientar estratégias eleitorais e narrativas públicas. Nos últimos ciclos, temas como educação, saúde e emprego formal dominavam os discursos. Agora, o eleitor médio deseja consumo, mobilidade e conectividade.
👉 Isso significa que políticos atentos às pesquisas tenderão a:
- 
Prometer redução de impostos sobre automóveis e crédito facilitado;
 - 
Defender expansão de redes 5G e inclusão digital;
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Falar em “autonomia” e “liberdade financeira” — conceitos caros à geração pós-pandemia;
 - 
Minimizar temas como reforma educacional e fortalecimento do SUS, que caíram na escala simbólica do desejo.
 
Na prática, é o nascimento de uma nova gramática eleitoral: menos idealismo, mais imediatismo.
O Brasil do “carro e celular” não sonha com instituições — sonha com ferramentas.
🔍 Vá mais fundo
A pesquisa do Vox Populi ouviu 3,2 mil pessoas em oito regiões metropolitanas, entre 31 de julho e 17 de agosto de 2025, com nível de confiança de 95%.
Os dados, embora sociológicos, têm implicações diretas na arena política: indicam que a pauta do “progresso individual” substitui a do “bem-estar coletivo”.
Em resumo: o desejo nacional está mudando de direção — e os políticos já estão ajustando o GPS.
								





