Nenhum advogado dos réus da ação penal que julga a tentativa de golpe perdeu tempo durante o julgamento com a vã tentativa de negar a existência do delito. Todos construíram sua defesa pautados somente pelo objetivo de reduzir a relevância da participação de seus clientes na conspiração. Tentou-se transformar protagonistas em coadjuvantes. E só.
Todos, menos um: a defesa de Bolsonaro. Explica-se. Como seu papel protagonista é evidente, restou a ela a estratégia do desespero, de negar o fato em si ou refutar o que em tudo ali há de mais farto: provas.
Provas? Para o governador Tarcísio Freitas a constatação é um sintoma delirante: “é um absurdo” – define assim, numa palavra extrema, o conjunto da investigação e o relato acusatório do Procurador-geral para justificar seu compromisso com a iniciativa de um indulto ao ex-presidente tão logo suba a rampa do Palácio do Planalto em 2027.
Tarcísio atua no modo cínico. Articula com os deputados do Centrão um projeto de anistia sem chances de aprovação final apenas para conquistar a simpatia dos bolsonaristas à sua própria candidatura. Oferece, com a fingida cruzada, o beijo da morte à carreira política do ex-presidente como se estivesse movido por sincera gratidão. Eu disse “cínico” porque me imagino educado. Carlos Bolsonaro, filho do réu, foi mais direto ao ponto: “São uns ratos”.
Tudo isso já está mapeado para a semana final do julgamento. Congresso e Supremo bem ensaiados para os resultados previsíveis: a condenação dos réus agora e, logo a seguir, o abrandamento necessário do rigor que definiu penas indistintamente duras para os participantes dos episódios de 8/1 na Praça dos Três Poderes. E que venha 2026.
Porém, às vezes, a esperteza, quando demasiada, engole o esperto. Nessa manobra de simulação de Tarcísio Freitas, o governador corre o risco de derramar o mel e perder a cabaça: a subserviência ao bolsonarismo que se esforça em demonstrar agora – renegando valores políticos democráticos e de soberania nacional e, com isso, tomando maior distância dos anti lulistas moderados – pode não ser suficiente para, uma vez preso o ex-presidente, convencer os filhos do condenado e sua legião de bárbaros digitais a recuarem para um plano de discretos e complacentes coadjuvantes de um projeto de design pragmático, onde terão relevância progressivamente reduzida, sabem disso.
Com reserva, preservo minhas dúvidas quanto a este happy end.
