
A Segunda Turma do TRF-5 encerrou hoje uma das tensões mais sensíveis do litoral cearense: por dois votos a um, os desembargadores negaram o recurso do ICMBio e da concessionária Urbia e mantiveram proibida a cobrança de taxa aos turistas que cruzam o Parque Nacional para chegar à Vila de Jericoacoara.
A decisão reafirma o entendimento jurídico que já havia prevalecido na primeira rodada do processo: não se pode cobrar pelo único caminho de acesso a uma área urbana. Na prática, o tribunal classificou a cobrança defendida pelo ICMBio e pela Urbia como um pedágio sem respaldo legal.
A derrota institucional
Para o ICMBio, o resultado tem peso político. O órgão federal havia surpreendido a comunidade no domingo ao ingressar com pedido alinhado integralmente à tese da concessionária, rompendo o discurso de mediação que mantinha até então.
A movimentação gerou indignação na vila — e agora, com a derrota jurídica, expõe um desgaste desnecessário entre Brasília e uma das comunidades mais emblemáticas do turismo cearense.
A reação de Jericoacoara
O clima na vila foi de alívio e recado político. Lucimar Marques, presidente do Conselho Comunitário, foi direta: “A gente se sente traída pelos nossos vizinhos. O ICMBio mora dentro da vila.”
O prefeito de Jijoca, Leandro Cezar (PP), que acompanhou o julgamento em Recife, reforçou o tom: “O ICMBio descumpriu sua palavra. Recebemos com indignação.”
Para ambos, a vitória reafirma um princípio central: nenhuma política de concessão pode restringir o direito de ir e vir da comunidade que vive exclusivamente do turismo.
O que o TRF-5 decidiu
Os magistrados mantiveram a linha já firmada em decisões anteriores:
- não existe rota alternativa para chegar à Vila de Jeri;
- cobrar pelo acesso equivaleria a um pedágio sem previsão legal;
- o modelo de concessão não pode criar barreiras artificiais a um destino urbano;
- a proteção jurídica do visitante, do morador e do município prevalece sobre o desenho financeiro da concessionária.
A decisão preserva o entendimento de que a gestão do parque é federal, mas o direito de acesso à vila não pode ser condicionado a uma tarifa imposta pela concessionária.
Leitura Focus Poder
O julgamento consolidou três movimentos relevantes:
1. O Ceará, até aqui, venceu a disputa narrativa. A comunidade mobilizada, a prefeitura na linha e a pressão pública mostraram peso real na arena federal.
2. O ICMBio errou o cálculo político. Ao apostar na sustentação da concessão, perdeu apoio local sem conquistar o resultado jurídico esperado.
3. A tese do acesso livre saiu fortalecida. O TRF-5 deixou claro que o modelo de concessão não pode funcionar à revelia das particularidades geográficas e sociais da região.
A derrota de hoje não encerra a discussão sobre a gestão de Jericoacoara — mas marca um limite claro: a vila não aceita ser tratada como parte acessória de um contrato federal, e o Judiciário reconhece essa singularidade.






