Por Frederico Cortez
O grande desafio que considero neste século reside em encontrar o ponto de equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a proteção do meio ambiente. Dois pontos opostos em seus conceitos originais, mas que podem andar de mãos dadas se adotadas as devidas políticas públicas que abarcam os dois objetos. Desse consenso, nasce o que denominamos de desenvolvimento sustentável.
A terminologia “desenvolvimento social” surgiu pela primeira vez no relatório “Nosso Futuro Comum”, também conhecido como “Relatório Brundtland” em homenagem à primeira-ministra da Noruega Gro Harlem Brundtland que coordenou a elaboração do documento em 1987, publicado pela Comissão Mundial de Meio Ambiente e Desenvolvimento. Tal tratado foi a base para a realização da ECO-92, Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que reuniu chefes de estados com o objetivo de iniciar a cultura do desenvolvimento sustentável. Esse encontro no solo brasileiro aconteceu 20 anos depois da realização do primeiro evento mundial desta natureza, no ano de 1972 em Estocolmo (Suécia).
No Brasil, já vigora desde o ano de 1981 a Lei 6.938 que trata sobre a política nacional do meio ambiente, onde destaca a sua missão em seu artigo 2º ao frisar que “tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana”. A lei 7.661/88 é outra importante legislação sobre a questão ambiental, que integra a Política Nacional para os Recursos do Mar (PNRM), assim como faz parte também a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA). Desta soma, ficou instituído o Plano Nacional de Gerenciamento Costeiro (PNGC).
No caso, o art. 10 do PNGC versa sobre o enquadramento das praias como “bens públicos de uso comum do povo”, tendo sempre o pleno respeito ao seu amplo acesso e de forma livre, estendendo-se esse garantismo de circulação ao mar também. O §1º deste artigo proíbe de maneira clara qualquer tipo de urbanização (leia-se construção, edificação ou alteração da paisagem natural) ou outra forma de utilização do solo na Zona Costeira que cause impedimento ou imponha dificuldade no acesso às praias e ao mar.
O Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) editou no ano de 2002 a Resolução 303, que dispõe sobre a Área de Proteção Permanente (APP) com a definição das localidades e os limites da sua aplicação. Em se tratando de região litorânea, destaco aqui três conceitos inerentes à APP que são: restinga, manguezal e duna. Elementos esses que sentem-se ameaçados com a edificação de complexos de resorts hoteleiros no litoral brasileiro. Um fato curioso é que a proteção aos mangues já vem sendo disciplinada desde os tempos da Coroa portuguesa, quando um regimento foi editado no ano de 1577.
Em setembro do ano passado, o Conama revogou quatro de suas resoluções dentre elas a de número 303. A questão foi bater no Supremo Tribunal Federal (STF), onde a ministra Rosa Weber decidiu liminarmente pelo retorno da validade da Resolução 303. No caso, o órgão executivo do meio ambiente autorizou a edificação em faixa litorânea após cem metros a partir da linha preamar em se tratando de restinga (área arenosa paralela à linha da costa e que possui cobertura vegetal com diferentes comunidades que sofrem diretamente influência marinha). Ao fim, em menos de dois meses após a liminar deferida pela ministra Weber, o Pleno do STF confirmou o entendimento da julgadora retornando assim o status inicial da Resolução nº 303. A resolução em questão, já delimitava anteriormente a essa decisão administrativa do Conama que a mesma área de proteção era de trezentos metros, o que ficou mantido de acordo com o julgado pela Corte constitucional brasileira.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) tem entendimento firme de que não cabe a aplicação da teoria do fato consumado em matérias de direito ambiental. Assim, não é aceitável o argumento de que uma obra já edificada em área ambiental não pode sofrer as penalidades (multa e demolição) advindas da legislação afeita ao meio ambiente. A fundamentação desse entendimento já pacificado pela Corte brasileira é de que a teoria do fato consumado em direito ambiental criaria o direito de poluir. Desta feita, ficou chancelado pelos ministros do STJ que o direito à propriedade não é absoluto quando confrontado com questionamentos de ordem ambiental, tendo assim essa restrição quanto ao direito constitucional do exercício da livre iniciativa privada.
A decisão do STJ segue à risca a dicção da Lei 12.651/2012, que regulamenta a proteção da vegetação nativa, estando assim autorizada a intervenção ou redução da vegetação situada em Área de Preservação Permanente (APP) tão somente nos casos de utilidade pública, de interesse social ou de baixo impacto ambiental previstas na legislação específica. Fora isso, é crime ambiental e toda edificação deverá ser demolida e o custo para a recomposição da vegetação destruída deve ser arcada pelo infrator ambiental. Como assim resta clara e inequívoca a redação dos arts. 7º, §1º; art. 8º, caput e §1º da lei ventilada aqui.
A vinda de empreendimentos hoteleiros é mais do que bem-vinda, digo que necessária. O Brasil goza de uma peculiaridade única por possuir uma extensão territorial continental, propiciando assim vários cenários para a construção de hotéis, resorts e parques aquáticos. Entendo que, o equipamento hoteleiro ao publicizar o respeito ao meio ambiente desde a escolha da sua edificação, transitando para a forma sustentável do uso da água e quanto ao tratamento do seu lixo produzido, ganhará mais credenciais positivas de seus clientes já assíduos e em potencial.
De certo que, o litoral nordestino vem sendo palco de vultosos investimentos na última década. As faixas litorâneas dos estados do Ceará, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Bahia vêm cada vez mais chamando atenção de investidores internacionais para fins de instalação de grandes resorts. No entanto, frise-se que todas as edificações nessas áreas devem obedecer a legislação ambiental brasileira no propósito de manter o equilíbrio do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável da economia local e regional.
Investir no meio ambiente é acreditar no sucesso do negócio!
Leia Mais
+ A extrafiscalidade da tributação no crédito de carbono, por Frederico Cortez