Por Frederico Cortez
O Governo Federal publicou a Lei 14.195/21 na semana passada, que trata sobre novo processo de abertura de empresas, proteção de acionistas minoritários, a facilitação do comércio exterior e, principalmente, quanto ao Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira). Neste último, o Estado assume de vez a sua voracidade contumaz e desnecessária frente à sua fome arrecadatória, mesmo que isso venha a significar um atropelo mortal dos direitos individuais dos contribuintes.
A nova legislação em vigor desde a última quinta-feira,26, veio como uma colcha de retalhos onde em certa parte destoa da sua premissa apresentada, como novo regramento de facilidades para todos. No caso, o ponto nodal reside na instituição de uma poderosa ferramenta que burla toda e qualquer premissa básica acerca da plena obediência aos princípios do contraditório e da ampla defesa, do devido processo legal e da menor onerosidade ao devedor. Todos esses postulados axiológicos ancorados na livre iniciativa e no garantismo do desenvolvimento nacional, que fazem parte dos princípios fundamentais da Constituição Federal de 1988.
O Sistema Integrado de Recuperação de Ativos (Sira), que será governado pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, vem descrito no Capítulo V da Lei 14.195/21. Assim, a sua embalagem legal o apresenta como um elemento “constituído de um conjunto de instrumentos, mecanismos e iniciativas destinados a facilitar a identificação e a localização de bens e de devedores, bem como a constrição e a alienação de ativos”. De pronto que, resta observado que não se vislumbra a defesa administrativa em momento algum do novo texto legislativo, dentro do poderoso escopo do “Sira”.
A controvérsia é gritante diante de tal ferramenta administrativa do fisco nacional, onde dista que haverá o “respeito à privacidade, à inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem das pessoas e às instituições”, elencado no inciso IV, do art. 15 da nova Lei. Contrariamente mais acima, logo ali no inciso III do art. 14 da mesma coluna legal, será um dos objetos do “Sira” a reunião de “dados cadastrais, relacionamentos e bases patrimoniais de pessoas físicas e jurídicas para subsidiar a tomada de decisão, no âmbito de processo judicial em que seja demandada a recuperação de créditos públicos ou privados”.
Ou seja, antes mesmo de ajuizar alguma medida contra o contribuinte junto ao Poder Judiciário, a Fazenda Nacional irá vasculhar toda a vida patrimonial da pessoa física ou pessoa jurídica. Acrescente-se que, essa linha de investigação precoce vai mais além dos dados cadastrais, estendendo-se também para os relacionamentos e bases patrimoniais das pessoas requisitadas. Lembremos que mesmo em sede de processo administrativo, o Supremo Tribunal Federal (STF) já pacificou o respeito ao devido processo legal, em soma com a obediência ao contraditório e ampla defesa.
Inobstante ao dever-poder do Estado em recuperar os seus ativos, os algoritmos afeitos ao Sira irá campear sobre todo e qualquer dado da pessoa ou empresa, e aqui insere-se as redes sociais (o que já acontece atualmente). A diferença é que agora vem com esse rótulo e com o seu disciplinamento em lei. Outra observação necessária, diz respeito ao alcance do Sira. Ou melhor, a falta de um teto para a sua atuação, pois “os insumos de dados e informações relevantes para a recuperação de créditos públicos ou privados serão garantidos com a “com a quantidade, a qualidade e a tempestividade necessárias” (Art. 14, V da Lei 14.195/21).
Pela hora, nos resta aguardar os movimentos de questionamentos e impugnações de pontos da Lei 14.195/21 junto ao STF e que não deve demorar muito, avalio. No entanto, o silêncio de todos importará na anuência das novas (des)medidas da Fazenda Nacional, que já digo que escapam à essência de um Estado Democrático de Direito. Neste, infere pontuar que os fins jamais devem justificar os meios!