Um dilema econômico. Por Rui Martinho

COMPARTILHE A NOTÍCIA

Rui Martinho é professor da UFC, advogado, bacharel em administração, mestre em sociologia e doutor em história. Com 6 livros publicados e vários artigos acadêmicos na área de história, educação e política. Assina coluna semanal no Focus.jor.

Dilemas, do pondo de vista filosófico, na perspectiva da lógica sentencial, são raciocínios que têm como base duas proposições divergentes e excludentes, exigindo necessariamente a uma escolha, devendo chegar a uma conclusão decorrente tanto da premissa adotada como da rejeitada, uma vez que a escolha por exclusão pode se fazer presente. Os dois termos antecedentes, do conjunto dos termos do dilema são condicionantes e o terceiro uma disjunção (J. Ferrater Mora, 1912 – 1991). A conclusão pode ser uma disjunção, uma afirmação ou negação. O dilema é de natureza ética quando envolva valores axiológicos em conflito, que é uma pretensão resistida. As condições transcendentais do agir moral são a existência de normatividade moral; capacidade e consciência do sujeito da conduta; e liberdade do agente (Immanuel Kant, 1724 – 1804).

A economia é o lugar por excelência das escolhas nas condições mencionadas. Os agentes econômicos não fazem tudo o que querem, nem somente o que desejam. Mas algumas escolhas, ainda que entre opções pouco atraentes, são realizadas nas transações diárias. Consumidores, investidores e autoridades econômicas decidem com variado grau de satisfatividade, conforme sejam total ou parcialmente atendidos ou inteiramente negados os seus interesses, paixões e valores.

A pandemia paralisou ou restringiu severamente grande parte da economia. O primeiro dilema foi limitar as atividades que propiciavam a propagação do vírus, ainda que prejudicando a economia. Salvar vidas, prioridade maior da que a economia, foi a escolha em todo o mundo, em maior ou menor grau. A medida compensatória, na forma de um auxílio emergencial foi a segunda escolha, também irrecusável, nas circunstâncias. O equilíbrio fiscal foi sacrificado. A inflação, fera impiedosa, não perdeu a oportunidade de agir em todo o mundo.

Agora a pandemia recua de modo significativo, sem fechar a porta para mais uma onda em que as parcas (mitologia romana) ou moiras (mitologia grega) virão surfando. Discute-se o fim do auxílio emergencial, decisão contrária ao interesse eleitoral de alguns, aos sentimentos e interesses de muitos e à razão de poucos preocupados com a estabilidade da moeda e o equilíbrio fiscal, cuja falta pode ser dolorosa para os mais vulneráveis. É fácil conceder um benefício, mas retirá-lo é politicamente difícil. Então surge a ideia de transformá-lo em programa de transferência de renda, coisa geralmente aplaudida por muitos, exceto quando possa beneficiar eleitoralmente o adversário. A bandeira da austeridade fiscal trocou de mãos e de lado. Quem dizia que desequilíbrio fiscal é o caminho do desastre agora entende que na presente circunstância ele é o mal menor. Quem achava que austeridade era coisa de abutres farejando carcaças humanas agora se escandaliza com a flexibilização do “famigerado” teto fiscal.

Assim caminha a humanidade e o Macunaíma ocupa um lugar de honra no bloco dos artífices de problemas e de soluções éticas de conveniência. A moralidade de ocasião não se confunde com a ética da responsabilidade nem com a da convicção. Tem raízes nos interesses personalistas, embora seja invocada pelos arautos do interesse público. A instabilidade dos significados recorre, frequentemente, a mutação semântica. Lembrar que as línguas são vivas, ressignificar as palavras é um poderoso instrumento de prestidigitação. Vivemos um tempo em que autores de nomeada, buscando arrimo na sociolinguística, refazem sem cerimônia a língua, aparentando sabedoria conforme conselho de Nicolau Maquiavel (1469 – 1527).

COMPARTILHE A NOTÍCIA

PUBLICIDADE

Confira Também

GM vai montar elétrico Spark no Ceará: importante fato novo industrial — e ativo político para Elmano

“Vamos pra cima”: Elmano endurece discurso em meio à onda de violência no Ceará

AtlasIntel: entre criminalidade e economia estagnada, Lula vê erosão no apoio e avanço de Tarcísio

Chiquinho Feitosa reúne Camilo, Evandro e Motta em articulação para 2026

A disputa no Ceará e os passageiros do carro dirigido por Ciro Gomes

Do cientista político Andrei Roman (AtlasIntel): Lula não é favorito em 2026 porque perdeu o ‘bônus Nordeste’

Vídeo de Ciro no centrão: discurso contra Lula e aceno à centro-direita e centro-esquerda

O roteiro de conversas e articulações que aponta Ciro candidato no Ceará

O que você precisa saber sobre a venda da Unifametro para o grupo que controla a Estácio

Disputa entre Ceará e Pernambuco derruba comando da Sudene e escancara guerra por trilhos e poder no Nordeste

Guararapes, Cocó e De Lourdes têm a maior renda média de Fortaleza. Genibaú, a menor

Moraes manda Bolsonaro para prisão domiciliar após vídeo em ato com bandeiras dos EUA

MAIS LIDAS DO DIA

Advocacia: a voz que não se deve calar. Por Camilla Goés

STJ: Planos de saúde devem cobrir emergências em cirurgias estéticas

GM estreia produção de carros elétricos no Polo Automotivo do Ceará

Bolsonaro está “debilitado” e não irá a julgamento, diz advogado

STF mantém validade de delação sobre trama golpista envolvendo Bolsonaro

Cesta básica em Fortaleza registra queda de 2,04% em agosto de 2025

Do básico ao topo: Hapvida diversifica e aposta no premium

Brasil é 4º país com mais jovens fora da escola e do trabalho, alerta OCDE

Infância endividada; Por Gera Teixeira