Em Deus, eu acredito. Para todo o resto, tragam dados. Esse é um mantra bem conhecido na área da programação, que vem fazendo eco também no mundo do marketing. A abundância de informações e as pegadas digitais que deixamos têm proporcionado uma grande oportunidade às empresas: desenvolver uma gestão cirúrgica de marcas, produtos e clientes prevendo possíveis comportamentos com base em um ecossistema de dados. Seja muito bem-vindo ao marketing preditivo.
Se nos primórdios as decisões de marketing levavam em consideração um sistema de informações mercadológicas – o clássico SIM – atuando de forma estanque, agora a ideia é outra: alimentar máquinas com informações passadas para prever ações futuras, fazendo ajustes em tempo real. Nessa cartomancia digital, à medida que se melhora a qualidade dos dados, maiores as chances de acerto.
Falando bonito assim, parece uma grande novidade, mas tudo isso já está integrado à sua vida e talvez você nem perceba. A sua página inicial do Netflix é diferente da página inicial do seu vizinho, da sua prima, do seu irmão. As sugestões de título que são oferecidas junto ao catálogo da plataforma obedecem a uma lógica de escolhas anteriores de cada usuário.
De forma mais lúdica, é como se a Distrivídeo organizasse as prateleiras segundo os interesses de cada cliente que chegasse à loja. Vieram vinte mil pessoas ao mesmo tempo? Sem problema, o site trata de arrumar tudo rapidinho.
Na Amazon, Aliexpress e em outros marketplaces acontece o mesmo. Pelo simples fato de você ter acessado determinados produtos ou ofertas, “a prateleira” se reorganiza conforme seus interesses e gostos, graças ao super processamento dos algoritmos. Isso facilita as duas pontas no processo de venda, já que a diversidade de produtos é enorme.
Quer mais? Os supermercados não mandam por Whatsapp ou e-mail seu iogurte preferido em oferta porque você é gente fina. Ok, você pode até ser, mas as redes varejistas conhecem seus hábitos de consumo e com isso conseguem direcionar exatamente os produtos que você costuma comprar.
O Spotify faz exatamente o mesmo, direcionando estilos musicais e artistas aos quais você tem uma predisposição para gostar. Com direito, no final do ano, de uma análise personalizada e um tanto bem-humorada do que mais tocou nos últimos doze meses. Se você não está fazendo nada disso ou nem pensando sobre o assunto, é hora de se mexer.
O marketing preditivo, se por um lado otimiza o processo de escolha e personaliza entregas, por outro acende uma discussão sobre um possível atrofiamento de preferências. A linha entre fazer uma entrega única, exclusiva e condicionar comportamentos é bastante tênue. Afinal, o erro e o acerto, inclusive nas compras, são atos comuns, aos quais estamos todos sujeitos.
Arriscar incluir no carrinho um biscoito novo cujo sabor não se conhece ainda faz parte da vida cotidiana. Ouvir um artista desconhecido que caiu por acaso no nosso colo também. Filmes idem. Inclusive correndo o risco de não gostar. Nas redes sociais, as consequências têm sido mais sérias: o direcionamento de conteúdo seguindo preferências anteriores tem criado um abismo entre opostos, principalmente na esfera política.
É como se os dois lados fossem retroalimentados por tudo o que acreditam e pelo que mais amam e detestam, gerando um viés de confirmação cíclico: as informações que chegam até mim comprovam as ideias que defendo. Essas ideias, por sua vez, foram condicionadas pelas mesmas informações que chegaram até mim anteriormente.
Embora a discussão renda bastante, o uso de dados para análises preditivas é uma realidade e um caminho sem volta nas mais diversas áreas. No futebol, por exemplo, modelos matemáticos têm ajudado os clubes na escolha de atletas com características que vão muito além de ser canhoto ou destro, de gostar ou não de balada. Antes mesmo do futebol, o beisebol já utilizava essa metodologia, tendo seu caso mais clássico retratado no livro e no filme homônimo “Moneyball: o homem que mudou o jogo.” Vale assistir.
No campo da comunicação, essa capacidade preditiva pode contribuir substancialmente, permitindo a empresas e marcas entregarem a mensagem certa, no momento certo, para o público certo, diminuindo a dispersão, uma pedra no sapato dos meios de grande alcance como rádio e TV. A conversa entre marcas e consumidores, que antes era de um para milhões, passa a ser também olho no olho, tête-à- tête.
Os dados estão aí e são cada dia, assustadoramente, mais precisos. Entretanto, mais importante ainda é saber como e quando usar. Além de “acredito em Deus e para o restante tragam-me os dados”, também se fala que “data is the new oil”. De fato, a informação é o novo petróleo. Não pela abundância, mas porque em seu estado bruto não é de grande utilidade. No entanto, a informação refinada e processada pode gerar grandes resultados. Mãos à obra.
Três perguntas para mexer com seu juízo:
1) Sua empresa faz uso de algum tipo de análise preditiva? Há algum ecossistema de dados?
2) De que forma o comportamento do seu consumidor nas redes influencia as decisões de marca e/ou produto em geral?
3) Como trabalhar o marketing preditivo em pontos de contato digitais/físicos do seu consumidor?