Nunca foi tão fácil aumentar impostos. Invocando as palavras mágicas “reforma tributária” tudo é possível, inclusive instituir o IVA mais caro do planeta. A alíquota mínima de 26,5% é repetida como um mantra poderoso pelos arquitetos da reforma, com a promessa de neutralidade fiscal – uma entidade abstrata que surge sempre que há a intenção de onerar a carga tributária, vestida com o manto protetor da arrecadação. Os dados que estariam a sustentar essa previsão, todavia, permanecem ocultos. Talvez porque ninguém, de fato, saiba qual a alíquota ideal. O dogma dos 26,5% é questão de fé.
Os textos dos diversos projetos que moldam a reforma, elaborados no Ministério da Fazenda e enviados ao Congresso Nacional com apelo de urgência, revelam claramente a intenção de aumentar a arrecadação, driblar orientações judiciais estabelecidas e cercar o contribuinte por todos os lados. Ao passo que as novas cobranças são veladas, como o imposto sobre a tarifa de água e esgoto, que hoje não é onerada pelo IPI, nem pelo ICMS e nem pelo ISS, mas passará a sofrer a incidência do IBS/CBS.
Ao mesmo tempo, a redução do peso sobre a cesta básica, promovida pelos deputados, é alardeada como um motivo para a intensificação da pressão do fisco, ameaçando agora com uma alíquota de 28% – a mais alta do mundo para o IVA, concebida na busca do santo grau da neutralidade fiscal.
Não há espaço para discussão. Os debates no parlamento são colocados como obstáculos. Quando os contribuintes conseguem ser ouvidos, são imediatamente rotulados como lobistas. O fisco tenta esconder sua postura autoritária atrás do biombo da simplificação e modernização do sistema, falseando a complexidade e o voraz apetite contidos nos projetos. Tudo em nome do “interesse público”.
Os imensos e suntuosos prédios de Brasília são simbólicos, mostram os interesses que historicamente são atendidos com ostentação explícita. Cada instituição estatal busca mostrar que seu quinhão de poder é maior.
São os donos do poder, o estamento que tudo quer e tudo tem, como bem escreveu Raymundo Faoro, descrevendo nossa realidade com precisão. O império português legou-nos um estado patrimonialista, que, cultivado com zelo e dedicação, cresceu em magnitude. Um viva à máquina pública e outro aos “amigos do rei”.
Caminhando por Brasília, novamente abismado com a grandiosidade e beleza de seus oficiais edifícios, deparei-me com um homem de rua. Sua altura mostrava que teve alimento quando jovem, mas agora exibia lamentável aspecto. Muito magro, sem banhos, vestido com farrapos e com cabelo desgrenhado, aproximou-se e me disse: “Tenho fome, ajude-me por favor.” Dei-lhe algum dinheiro e ele se afastou, carregado de profunda tristeza. Talvez pressinta que, ao comprar alimento, arcará com o peso dos impostos.
Algo está profundamente errado: o alto valor que pagamos em tributos não chega até aos que mais precisam. Aumentar a arrecadação não trará mudança. Quando falamos em cortar despesas, imediatamente são apontados os benefícios sociais e a previdência. Por sua vez, a máquina pública não deixa de crescer e seus monumentos continuam a brotar. E os “amigos do rei”? Estes, estão cada vez mais prósperos.
