É comum ouvir por aí que “pesquisa eleitoral é o retrato de um momento”. Retrato? Exagero. É rascunho: o que chamamos de “momento” é uma abstração, uma tentativa de recorte do que é contínuo. Contínuo e veloz, muita vezes. Portanto, pesquisas se escrevem a lápis.
Quem lê pesquisa como quem consulta baralho – há muitos por aí – não sabe qual é sua serventia. Mais revelador do que uma pesquisa em si, por exemplo, é observar o que aconteceu entre ela e a anterior. Frequentemente, o movimento diz muito mais do que os números.
Nem sempre os percentuais que se prestam ao espetáculo do jornalismo de resultados que causa frisson nos incautos são o que o levantamento traz de mais relevante como indício orientador para a compreensão do tal “momento” que a pesquisa “retrata”.
Isso fica muito claro quando se passa em vista, por exemplo, a última pesquisa AtlasIntel e, a seguir, se assiste à entrevista que o site Focus Poder fez com o CEO do instituto, Andrei Roman – uma aula de como se deve ler uma pesquisa de opinião.
Na minha leitura, é perceptível que o eleitorado se encontra num processo inicial de apreensão dos elementos de conteúdo da conjuntura eleitoral, o que é compatível com o momento (olha ele aí de novo) de início da propaganda nos veículos de massa.
Os eleitores, por exemplo, não tinham (e muitos ainda não têm) resposta para uma pergunta capital: que candidato representa o projeto político do Lulismo? A resposta veio e a cidade revelou, com o crescimento de Evandro Leitão, a importância que confere a ela.
A leve recuperação do Capitão Wagner, que seguia em queda livre, pode ter relação com isso, igualmente, como reação de “voto útil” dos que rejeitam a centroesquerda e buscam abrigo fora das ofertas amplamente desacreditadas do prefeito que lacra, mas não convence.
O desempenho – surpreendente, para muitos – do deputado André Fernandes se afirma, uma vez mais, como expressão política do fracasso do espectro político de centro, cujo fisiologismo atávico dá mostras de saturação e empurra o conservadorismo para leitos radicais.
Ao fim, o “salve” geral que Fortaleza manda é: a cidade continua ciosa em sua recusa a pratos feitos e que, sem um contentor que afirme maior prevalência, tende, uma vez mais, a deixar sua decisão para ser tomada somente depois que os competidores cruzarem a última curva e entrarem na reta de chegada.
Até lá, emoções. E dúvidas, porque as certezas são patrimônio dos desinformados.