A criminalização do descrédito de medidas públicas no caso Nikolas Ferreira x Pix. Por Frederico Cortez

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Por Frederico Cortez

A Constituição Federal de 1988 nos garante um dos seus pilares mais importantes, sustentáculo do Estado Democrático de Direito e moldura do republicanismo brasileiro, qual seja: a liberdade de expressão. O ponto nevrálgico agora surge com o episódio do caso Pix e o vídeo do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG), que rompeu em pouquíssimos dias a casa de 300 milhões em números de visualizações somente em uma de suas redes sociais.

O impacto da repercussão foi tamanho ao ponto de causar um recuo na política econômica do País, que destacou por diversas vezes que o sistema de pagamento digital Pix não iria ser taxado. Ao contrário, a manifestação do deputado mineiro sustenta que há sim uma possibilidade da imposição de mais um “imposto” nas transações acima de R$ 5 mil para pessoa física e de R$ 15 mil para empresas.

Neste cenário eis que emerge mais a expressão “descrédito de medidas públicas”, afeita ao ato que desencadeou numa verdadeira enxurrada de desinformação nos quatro cantos do Brasil. Uma coisa é falar uma “besteira”, ou uma inverdade inocente e despretensiosa numa mesa de bar ou na roda de amigos aqui e acolá.

Agora, a via implacável das redes sociais tem sua própria “verdade” e velocidade a depender de quem a propaga e da extensão do cortejo de seus seguidores. Neste caso, o País que está ainda imerso na polarização da eleição de 2022 foi alvo de uma postagem que sacudiu a vida de todos os brasileiros, a favor ou contra o que estava sendo veiculado.

Inegável é que a depender do conteúdo a ser publicado na internet, o seu poder de fogo pode ser devastador com consequências graves e irreparáveis para toda uma nação. Em relação à polêmica do parlamentar federal Nikolas Ferreira, mormente quanto ao seu poder de influenciar os seus eleitores e milhões de simpatizantes, o vídeo do Pix acarretou em grande dano coletivo, tendo inúmeros negócios e empreendedores se negando a receber pela venda de seus produtos/serviços via Pix.

Digo isso, a liberdade de expressão não autoriza proliferar “pensamentos próprios” sendo sabedor que haverá uma grande repercussão nacional negativa e que afeta a vida de todos nós. Vou além ainda, postar na rede social uma opinião com potencialidade nefasta à economia do Brasil não traz o condão de ressignificar o conceito de debate democrático. A democracia é embasada em conversas e entendimentos ponderados e sem o fim de atacar ou causar prejuízo a certa pessoa ou instituição pública.

Com toda certeza, aposto todas as minhas fichas que o case “Nikolas x Pix” vai inaugurar mais uma nova face interpretativa do exercício da liberdade de expressão à luz da Constituição Federal de 1988, pelo Poder Judiciário em especial o Supremo Tribunal Federal (STF). O corolário do que hoje é conhecido por “engajamento”, em tempo outrora era tido por “efeito manada”. O que isso importa? Importa que quando algum tipo de conteúdo alcança esta fase, não se busca mais saber a verdade real e sim, tão somente, ir com os outros na linha do quanto pior melhor. Infelizmente!

A Egrégia Corte constitucional brasileira por diversas vezes já se posicionou contrariamente ao absolutismo da liberdade de expressão, o que comungo veementemente.

De certo e inegável quanto à responsabilização de conteúdo por influenciadores, independentemente do seu campo de atuação. Neste caso específico do vídeo do Nikolas, a forma como foi pincelada o tema acarretou num sentimento de insegurança financeira em todo o País e como consequência criou-se um estado de descrédito ao sistema de transferência e pagamento eletrônico que é o Pix.

O grau de arranhadura foi exponencial, causando até mesmo uma redução em 15% no número de transações financeiras pelo Pix em relação à novembro do ano passado, informação essa já divulgada pelo Banco Central. A desordem caudada pelo vídeo do parlamentar mineiro provocou Governo Federal ao ponto de ter que editar uma Medida Provisória sobre a não taxação do Pix, para fins de reforçar ainda o não monitoramento pela Receita Federal.

Aqui nesta análise, não estou aqui induzindo ou desejando impor uma mordaça ao cidadão no exercício da sua sagrada e intocável liberdade de expressão, mas sim, tão somente só, a manutenção da estabilidade social, sendo esta considerada um bem maior coletivo para todos nós.

Sendo assim, entendo que o mesmo poder de engajamento de influenciadores, políticos e autoridades nas redes sociais atrai proporcionalmente a responsabilidade social individual quanto ao conteúdo a ser exposto.

Por fim, avalio que a liberdade de expressão é livre, porém não deve inaugurar um estado de caos em favor de um interesse próprio.

Frederico Cortez é advogado, sócio fundador do escritório Cortez & Gonçalves Advogados Associados. Especialista em direito civil, direito empresarial e direito digital. Presidente da Comissão Especial de Propriedade Intelectual, Mídias, Entretenimento, Direito e Novas Tecnologias da Ordem dos Advogados do Brasil, Secção Ceará. Autor de diversos artigos de opinião jurídica, sendo referência bibliográfica em obras acadêmicas e livros jurídicos. Diretor jurídico do Focus Poder e escreve aos fins de semana

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