Em um estado marcado por secas cíclicas, a segurança hídrica é um valor estratégico determinante para o futuro da população e da economia do Ceará. Por esse motivo, a apresentação dos Estudos de Impacto Ambiental (EIA/Rima) da planta de dessalinização de Fortaleza, a Dessal, é etapa fundamental para que a construção do equipamento prossiga com a devida celeridade.
O EIA/Rima da Dessal será apresentado em uma audiência pública agendada para esta sexta-feira, 25 de agosto, na Sede Social do Sindicato dos Servidores da 7° Região da Justiça do Trabalho (Sindissétima) (R. Renato Braga, 203, Vicente Pinzon), às 9h30.
O ponto central é o seguinte: para um estado encravado no semi-árido, na linha do Equador, a dependência do regime de chuvas é uma temeridade. Afinal, sabe-se que os períodos de estiagem são recorrentes e costumam ser severos.
O último grande período de seca no Ceará ocorreu entre os anos de 2012 e 2016. Foram cinco duros anos com chuvas bem abaixo da média. Esse período, tão recente, é considerado a pior estiagem desde que o Estado começou a organizar os dados pluviométricos há cerca de 113 anos.
A nossa última estiagem poderia ter sido uma tragédia como a que se verificou em 1915, o auge de uma seca retratada no primeiro romance da ainda adolescente Rachel de Queiroz, o clássico O Quinze. A obra mostra com agudeza a vida e morte de retirantes que caminhavam do vasto sertão para se abrigar em Fortaleza.
A emigração tratava-se de uma questão de sobrevivência: “A criança era só osso e pele: o relevo do ventre inchado formava quase um aleijão naquela magreza, esticando o couro seco de defunto, empretecido e malcheiroso” – Cap. 10, pag. 60.
Mas, por qual motivo a tragédia romanceada por Rachel de Queiroz não se repetiu cem anos depois? Simples: o Ceará vem se preparando há décadas para superar o quadro causado pelas secas com políticas de recursos hídricos bem planejadas. Mesmo assim, reservas como o grande Castanhão pratizamente zeraram na estiagem mais recente.
Tanto que Fortaleza passou por uma perigosa situação que impeliu o Governo a por em prática programas emergenciais para garantir o fornecimento mínimo de água na Capital ao mesmo tempo em que projetou ações de médio prazo. Afinal, estamos sempre à espreita de um novo período de poucas e mal distribuídas chuvas.
Uma das principais ações públicas para gerar segurança hídrica para Fortaleza foi justamente o lançamento do projeto da Dessal que agora começa a ser analisado do ponto de vista do equilíbrio ambiental.
O que está em jogo é o acesso pleno à água de beber da população que mora na quarta maior cidade do Brasil. O imenso mar que já é um grande ativo econômico do Ceará (turismo, pesca, portos), agora vai servir de manancial para a água a ser servida em milhares de residências. Tanto para beber como para suprir as necessidades mais básicas de higiene e alimentação.
A SPE Águas de Fortaleza, sociedade empresarial que ganhou a licitação da Dessal, prevê iniciar as obras já no primeiro semestre de 2024, com início da operação em 2026. O investimento é de cerca de R$ 520 milhões. O equipamento ficará no bairro Praia do Futuro e terá capacidade de produção de 1 m³/s, aumentando em 12% a oferta de água e beneficiando cerca de 720 mil pessoas da Capital.
A dessalinização da água do mar para uso humano e doméstico é uma técnica já bastante conhecida no mundo.
Como é: A dessalinização da água do mar ocorre por meio de um processo chamado Osmose Reversa. Nesse modelo, a água é captada por uma torre submersa no mar e conduzida por tubos para uma estação elevatória que será construída em terra. Ela bombeia a água do mar para os primeiros filtros de areia, onde o líquido é separado de todo material particulado.
Após esse pré-tratamento, a água passa por filtros ainda mais finos antes de entrar no processo de Osmose Reversa, o coração do sistema, responsável por separar da água salgada os sais dissolvidos, deixando a água dessalinizada. A água passa, então, por um processo de remineralização, desinfecção e fluoração para atender aos parâmetros de potabilidade e então ser entregue nos reservatórios da Cagece, que é a responsável pela distribuição.
A SPE Águas de Fortaleza teve o cuidado de contratar a empresa israelense IDE Technologies, que já participou de projetos similares em países como Israel, Chile, Estados Unidos, Índia, Singapura e Taiwan.
As etapas burocráticas relacionadas à questão ambiental são obrigatórias e fundamentais para bom andamento do projeto. A expectativa é que a análise do EIA/Rima pelos órgãos públicos tanto do Estado quanto da Capital mantenha o equilíbrio entre a celeridade e a objetividade.
A audiência pública desta sexta-feira, que tem participação da estatal Cagece, é aberto à sociedade civil, entidades de classe e órgãos públicos. O objetivo dar visibilidade aos resultados dos estudos realizados sobre o impacto ambiental do projeto que transformará água marítima em água potável, além de responder dúvidas acerca do tema e coletar sugestões dos participantes.