
A história da imprensa no Ceará é também a história da formação da opinião pública e das disputas políticas que forjaram o estado. Desde cedo, os jornais não se limitaram a informar: foram usados como instrumentos de poder, trincheiras de combate e registros que atravessam o tempo.
O primeiro jornal cearense foi o Cearense, fundado em 1824, apenas dois anos após a Independência. Surgiu em um ambiente de efervescência política, no qual a imprensa era voz ativa contra ou a favor de governos locais, funcionando como espaço de disputa de ideias e de afirmação da elite letrada da província.
Em 1915, nasceu o Correio do Ceará, que se tornaria um dos jornais mais influentes por integrar os Diários Associados, a poderosa rede de Assis Chateaubriand. Sob o peso dessa estrutura nacional, o jornal foi porta-voz de setores conservadores e, ao mesmo tempo, canal de legitimação de alianças políticas locais. Por sete décadas, foi sinônimo de poder e prestígio, até encerrar sua trajetória em 1985.
Em 1928, surgiu O Povo, fundado por Demócrito Rocha. Diferentemente do Correio, nasceu com caráter combativo, próximo a correntes de esquerda e intelectuais modernistas. O Povo se projetou como espaço de crítica e engajamento cultural, disputando não apenas leitores, mas também corações e mentes em torno de uma visão de sociedade.
No mesmo ano, também em 1928, foi fundado o Unitário, por José Martins Rodrigues, um dos grandes políticos cearenses do século XX. Homem de ideias firmes e conduta íntegra, José Martins fez do jornal uma voz de oposição ativa e um instrumento de articulação política. O Unitário foi, antes de tudo, a expressão de um projeto político, onde o jornal se confundia com a trajetória de seu fundador, deixando um legado de coragem no enfrentamento público.
Poucos anos depois, em 1936, foi criado O Estado, por Manuelito Moreira Lima. Com perfil mais conservador, rivalizou diretamente com O Povo e serviu de sustentação a grupos tradicionais do poder cearense. Foi por décadas o jornal da ordem estabelecida, contraponto ao tom mais progressista de O Povo.
Em 1957, nasceu a Tribuna do Ceará, fundada por José Afonso Sancho. Posicionou-se como jornal de linguagem popular e direta, e manteve circulação por décadas, até encerrar suas atividades em 2001. Embora menos engajado ideologicamente, a Tribuna consolidou-se como espaço de proximidade com o cotidiano do leitor e de inserção política nos bastidores.
Em 1981, o Grupo Edson Queiroz lançou o Diário do Nordeste, dentro do Sistema Verdes Mares. Desde o início, foi expressão de um conglomerado empresarial de peso, ligado a rádio e televisão. Tornou-se o jornal de maior circulação no Ceará e representou a nova fase da imprensa, em que política e economia se encontram na lógica de grandes grupos de comunicação.
Ao longo de toda essa trajetória, o jornalismo cearense enfrentou períodos de censura que marcaram o país. Durante a Ditadura de Getúlio Vargas (1937–1945), o Estado Novo cerceou jornais, silenciou críticas e usou a imprensa como aparelho de propaganda. Décadas depois, no Regime Militar de 1964, as redações voltaram a ser vigiadas, com cortes, apreensões e perseguições, e mais uma vez cada jornal se posicionou de acordo com seus vínculos políticos e de sobrevivência econômica.
Com a chegada do século XXI, o jornalismo impresso declinou. Jornais encerraram publicação em papel e apostaram na modernização digital, diversificando formatos e disputando leitores no ambiente online.
Durante muito tempo, no Ceará como em todo o Brasil, bastava dizer “deu no jornal” para encerrar uma dúvida e atestar a veracidade de um fato. Essa confiança foi abalada pela multiplicidade de vozes da era digital, mas permanece o valor simbólico dos jornais que resistem. Mais que veículos, eles são arquivos vivos da política, da cultura e da sociedade cearense, testemunhas de um tempo em que a notícia, impressa no papel, carregava peso de sentença.
