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O que é o hotel seis estrelas? Por Marco Dalpozzo

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O belo, confortável e sofisticado está na absoluta integração com a natureza primitiva

“O que é um hotel seis estrelas?”

“Os cientistas são todos mentirosos!”

” Yes, but…

“Ah eu sei que deveria ser assim, mas será assado: existe um mercado que…”

Por Marco Dalpozzo*, especial para o Focus

Nos últimos dias escutei algumas destas frases que não saem da minha cabeça. Tentei experimentar, viver na pele e na atividade profissional, palavras dos livros científicos que gosto de ler e que me trazem reflexão, desafio intelectual, curiosidade, prazer de viver e de me aventurar. “A vida é maravilhosa”, escrevia Rachel Carson no seu incrível livro:” Primavera Silenciosa”.

Amante do mar, bióloga, em 1962, em um meio predominantemente masculino, Rachel abre seu livro com a frase do Albert Schweitzer: “O homem perdeu a capacidade de prever e de prevenir. Ele terminará por destruir a Terra”.

Com palavras certas e firmes, a cientista começou a dessacralizar algumas das novas tecnologias químicas e industriais que o ser humano estava usando para “melhorar” o meio ambiente – conforto e alimentação – mas sem se perguntar quais os impactos na terra e atmosfera. Quais os efeitos que uma tecnologia venenosa como o DDT, por exemplo, teria na biosfera e nas espécies, incluso o Sapiens. Geração de riqueza? Geração de empregos? Tudo bem, tudo ótimo para nós. E para ela, a natureza, nossa casa… qual o impacto?

Fiz a introdução para chegar ao tema que aqui vou focar. 6 Estrelas? O que é um hotel 6 Estrelas?

Fui me informar na selva da internet e cheguei a até 5 Estrelas. Ao menos assim o Wikipédia e outras “pedias” classificam a Hotelaria. Como o ser Humano não deixa de nos surpreender e inovar, ele é evolutivo, então deve ser algo novo que será registrado em breve, após suficientes experiências e “cases”. Me informo mais, navego nas complexas águas da internet e busco alguns exemplos.

Ah!, como sempre, o Brasil está atrasado, ainda não temos exemplos de 6 Estrelas por aqui, fruto da evolução dos “emergentes”: um grupo Tailandês então nós ensinará? Nós somos ruins a importar então, o mundo lá fora anda mais rápido e a gente aqui ainda se diverte em caminhar em trilhas de verdade, de brincar na areia ainda natural, em assistir umas tartaruguinhas babies irem para o mar pela primeira vez. Nos contentamos com babies irem para o mar pela primeira vez. Nos contentamos com chalés pé na areia refrescados com um ventilador de teto, somos sempre atrasados, não é? Que então venha o 6 Estrelas de fora.

Bom, pelo que entendi, um hotel 6 Estrelas é um punhado de acréscimos sobre o de 5. O mesmo acrescido, o mais do de sempre. Acréscimo de “coisas”, fartura de alimentos, mais serviços para os clientes proveniente do mundo urbano. Mais artificialidades das cidades grandes combinando com a busca de um pouco do que eles acham ser a natureza. Mais reprodução em um ambiente “Pure Nature” de comfort things urbanas e, o mais importante, razões para justificarem essa experiência como mais cara, em moedas, do que o de 5 estrelas. Lugar para gente riquíssima, em moedas.

No enredo, geração de empregos locais, então mais riqueza para a comunidade (mas ninguém explica que os cargos mais “nobres” serão para pessoas de fora já com experiências destas 6 estrelas).

O silêncio sobre o essencial permanece. Terá água suficiente para todos? Como será produzida a energia? Vai desmatar? Quantas arvores vão morrer? E os animais silvestres, irão para onde? Quantos laguinhos artificiais na frente da praia, e por quê? Qual impacto no solo, no ar e nos ventos? Na praia? E o ar-condicionado? Não dá para suar um pouquinho e banhar-se no mar?

Nem uma palavra concreta sobre o impacto ambiental destas “pérolas” do design e criatividade humanos.

Nas belíssimas imagens destes empreendimentos, nada disso é colocado, mas diga-se a verdade, não é nosso papel se autorregular. A responsabilidade não é do empresário em definir e fazer valer as regras de construção, licenciamento, mobilidade etc.

Ah, que país difícil e complexo é o Brasil! Difícil fazer negócio por aqui. Muitas leis, muitas regras, muita política. Então vamos delegar. Vamos deixar as prefeituras definirem as regras. Afinal, são elas que têm a responsabilidade sobre o destino das terras de seus territórios. Parece uma boa ideia para dar agilidade aos processos e não ficar por traz, mas será tão simples assim?

Escutei também esta frase: “Nada que as Hilux não resolvam…” de alguém falando sobre como convencer nativos pescadores de um certo vilarejo a tirar suas redes de pesca que, “atrapalhariam” a vista das casinhas do novo empreendimento 6 Estrelas. Redes que lhes garantiram o sustento desde sempre. Hilux resolvem, dinheiro resolve, tanto quanto os espelhinhos dos Portugueses quando chegaram por aqui em 1500.

Nativos extirpados de seu “core business” em troca de quatro moedas e um emprego mal pago e às ordens da equipe do 6 Estrelas. Esta parece ser basicamente a equação. Uma equação que funcionou com saldo de gols no século XIX e XX, mas que não vai mais funcionar no XXI.

Olha que já se foram 23 anos deste século, quase 25%. Rio 92 foi em 1992. Passaram-se mais de 30 anos. Chegava eu ao Brasil naquele momento. A princípio iria ficar três ou quatro anos. Ainda por aqui estou.

Desde então, pouco avançou a agenda de reversão de energias fósseis em energias renováveis. Pouco avançou do desenvolvimento econômico sustentável que inclua o social e o ambiental. Célere permanece a exploração da natureza e a frágil agenda da sustentabilidade.

Continuamos em um “mindset” século XX, um século prioritariamente do domínio das ciências econômicas (sou economista). Estamos ainda presos ao curto-prazismo da revolução industrial em detrimento da ecologia.

Estamos atrasados. James Lovelock, químico genial, intuiu já na década de 60 que a Terra era um planeta diferente dos outros. Nosso planeta era “Vivo, instável, cheio de gases, em contínuo desequilíbrio evolutivo”. Chamou a terra de “Gaia”, um grande único e maravilhoso organismo complexo que dava vontade de estar, conhecer, respeitar, escutar. A NASA o contratou. Um planeta único e maravilhoso, uma poesia, um privilégio estar aqui!

Nós Sapiens, prenhes de conhecimentos, precisamos abaixar a guarda se quisermos existir. Cristo quando veio e nos disse “cresçam e se multipliquem”, falou para aproximadamente trezentos milhões de seres humanos. Hoje somos 8 bilhões, com uma necessidade de consumo de recursos naturais insustentável, Se voltasse hoje, creio que Cristo já não diria o mesmo.

6 Estrelas para mim significam vento, mar, tartarugas, peixes. Natureza. Dormir com companheiros de aventura no meio de vilarejos puros com suas populações ainda não contaminadas pelo mundo artificial.

Nesses lugares renascemos. Como são abertos e felizes em nos receber, compartilhar seus conhecimentos, aprendo como uma criança curiosa. Como dizem os arquitetos “o último grau da sofisticação é a simplicidade”.

O Brasil ainda é único: nativo e, ao mesmo tempo, plenamente artificial e urbanizado. É o que Michele Pistoletto, mestre de arte italiano, chamaria de “Terceiro Paraiso”: democrático (com um idioma que toda sua população fala e entende) e ainda cheio de natureza. O quinto maior país do mundo em superfície é detentor de uma natureza única, diferenciada, maravilhosa, com uma população proporcional ao seu território (nem pouca e nem demais), repleto de diversidade natural, social, antropológica.

País com ar puro, com água pura, com mar limpo, com a floresta amazônica, um país longo e largo. Um país ainda equilibrado, ainda com uma certa harmonia entre econômico e ecológico.

No entanto, permanece um grande desafio: injustiça social, que não muda de tamanho e empobrece em todos os sentidos o próprio país, não deixando-o decolar. Amo o Brasil. Creio que seja o melhor lugar do mundo para se viver.

Os Brasileiros precisariam preservar mais, ter mais orgulho e defender mais seu imenso patrimônio natural e cultural. Não existe um outro país tão rico se olhado com estes KPIs (Key Performance Indicators) econômico/ecológicos/sociais e o hoje famoso ESG concept.

Vamos cuidar na pratica, além das palavras bonitas.

Como diria Charles Chaplin, “a vida é maravilhosa se não se tem medo dela”.

O italiano Marco Dalpozzo* é empreendedor de turismo sustentável ligado ao mar e ao vento. É professor da Fundação Dom Cabral e faz parte do conselho consultivo do Coppead (UFRJ).

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