“No company, no matter, how powerful it is l, will put our democracy at risk” diz o magistrado “slapping the table”, registra o repórter
“O herói do filme tem que continuar…”, graceja o Magistrado
A entrevista do ministro Alexandre de Moraes à revista New Yorker é o retrato de corpo inteiro de uma personalidade complexa e ambígua, como espelha a sua personalidade.
O entendimento que ele demonstra possuir sobre os limites e o alcance da opinião e os meios que podem projetá-la e ampliá-la são preocupantes. Em algumas passagens dessa interlocução transcrita como entrevista afloram ideias e preconceitos, desvios lógicos e convicções como se fossem termos de um parecer ou sentença conclusivos, pontuação que não permite tergiversação. Como se houvesse sido composta sob a forma de “abstract” do sumario de um alentada suma de conclusões finais.
As alusões a Joseph Goebbels, ao nazismo e à plataforma X, de Elon Musk, na mira de quem atira para ferir mortalmente, sem misericórdia, o inimigo, fixam a imagem e a índole autoritária do Magistrado. No melhor estilo de Goebbels e, por que não haveria de ser, de Alfred Rosenberg as sentenças e acusações caem alimentadas por um ar de ironia nem sempre bem sucedido.
O espírito totalitário enverga muitas roupagens, pode ser de direita ou de esquerda, não é padecimento de moléstia notória ao primeiro diagnóstico. Hitler e Mussolini antes de criarem as suas próprias razões de fé foram socialistas. As fronteiras entre esses territórios são volúveis, movediças e instáveis, como se fossem dunas de areia em um deserto continuo.
Atribuir a grupos esparsos de manifestantes a elevada periculosidade capaz de pôr em risco o estado democrático de direito é um
exagero, senão uma fantasia que o magistrado rege com teimosia. Julgar que a manipulação do discurso da “extrema”-direita é “um feito impressionante de lavagem cerebral”, em nível “inimaginável”, um acesso de transtorno do espectro desviante que não fica bem em um magistrado de derradeira e retumbante instância. Aperta no cós ou encolhe na altura…
Freud explicou com maestria essas diferenças e agudas semelhanças. O entrevistado poderia vestir o uniforme pretoriano dessas vertentes de autoritarismo.
A parte mais surpreendente vem, entretanto, ao término da entrevista quando o repórter lança seus olhos de Sherlock sobre um móvel de madeira, onde o ministro expõe os troféus das suas vitórias. Entre coisas miúdas, inconsistentes, duas deidades africanas de enorme prestígio na fronde sagrada dos orixás, entidades de famílias numerosas e não raro competitivas da umbanda.
Xangô e Exu ali estavam aprisionados em todo a sua incomensurável grandeza entre despachos e embargos processuais, ele próprio reconhecendo-se como “herói”: “Eu brinco com a minha equipe de segurança que o herói do filme tem que continuar…”.
Dos orixás, valham a representação de Xangô como portador da Lei; e de Exu da Ordem da força. Deles há de valer-se o magistrado em sereno sincretismo…
Pergunta-lhe com chave de ouro o jornalista Jon Andersen, com um riso contrafeito do entrevistado: “mas Xangô não é por sua vez também o Deus da guerra?” O Magistrado dissimula um riso apertado de indulgência, amostra de um complicado entroncamento de imperceptíveis intenções.
A entrevista é encerrada e entra para o estoque de feitos jornalísticos de Jon Anderson, no estilo “marrom” das matérias de outrora que fizeram a fortuna do jornalismo de Hearst e da Playboy, nos Estados Unidos. Chê Guevara, Fidel Castro, Hugo Chavez e Pinochet pertencem à galeria desse jornalista-biógrafo. Um especialista em cavaleiros totalitários. Hão de vir por aí outros biografados. Com essa estranha convergência de relações endogamicas com o poder do Estado.
“New Yorker” já não é aquela revista com um ativo intelectual que a projetou mundo afora, desde a “Round Table” do Hotel Algonquin, em Manhattan…
