
Viver no passado pode, sim, revelar uma inquietação diante do presente. Não porque lembrar seja um erro, mas porque a memória, quando se transforma em morada fixa, passa a competir com a vida que acontece agora. Relembrar é humano, é constitutivo da identidade. O problema surge quando o passado deixa de ser referência e passa a ser refúgio.
A lembrança saudável ilumina o caminho, oferece sentido, ensina. Já o pensamento insistente, repetitivo, que retorna sempre aos mesmos pontos, não busca compreender, mas controlar aquilo que já não pode ser modificado. Nesse movimento, a pessoa deixa de habitar o presente e passa a viver num tempo que não responde mais. O presente, então, é vivido de forma empobrecida, como se fosse apenas um intervalo entre recordações.
A vida psíquica exige renovação. O presente é o único espaço onde a experiência pode se transformar em ação, onde escolhas podem ser feitas e onde o corpo e a mente operam de forma integrada. Quando alguém se permite viver o agora, sem negar o que foi, mas sem se aprisionar a ele, cria-se um campo fértil para a adaptação, para o aprendizado e para o crescimento emocional.
Do ponto de vista neuropsicológico, essa abertura ao presente favorece a plasticidade cerebral. A experiência viva, variada e significativa estimula a formação e o fortalecimento das conexões sinápticas. A mente que se renova é aquela que se expõe ao novo, que aceita o movimento e que não se fixa em circuitos fechados de ruminação. O excesso de apego ao passado tende a reforçar padrões rígidos, enquanto a presença consciente amplia possibilidades.
Ter saúde mental não é apagar a história, mas permitir que ela cumpra seu papel e siga adiante. O passado deve ser um chão firme, não um teto baixo. Viver no presente é um ato de coragem silenciosa. É aceitar que a vida se faz agora, em permanente reconstrução, e que cada instante vivido com atenção e abertura renova não apenas o sentido da existência, mas também a própria energia vital que sustenta o pensar, o sentir e o agir.







