O pacto federativo do Brasil na vacina da Covid-19, por Frederico Cortez

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Frederico Cortez é advogado, sócio do escritório Cortez & Gonçalves Advogados Associados. Especialista em direito empresarial.  Cofundador do Instituto Cearense de Proteção de Dados- ICPD-Protec Data. Pós-graduando em Direito da Proteção e Uso de Dados pela PUC-Minas Gerais. Consultor jurídico no portal Focus.jor desde 2017. Escreve aos fins de semana. E-mail: advocacia@cortezegoncalves.adv.br / Instagram: @cortezegoncalveadvs.

Por Frederico Cortez

A Constituição Federal de 1988 estabelece a forma federativa do Brasil como sendo a base da sua organização. Assim, a União, Estados, Distrito Federal e Municípios têm sua autonomia preservada e outras competências compartilhadas entre si. Isso é denominado como “pacto federativo”. Tal formatação está prevista na CF/88 em seus artigos 1º e 18, com a ênfase na união indissolúvel dos entes federativos e ao mesmo tempo pregando a independência dos mesmos.

O momento atual é de muita confusão também para a política, em meio a busca urgente pelas vacina contra o vírus Sars-Cov-2. Nesse contexto, os estados do Nordeste uniram ideais dando origem ao Consórcio Nordeste quando ainda no início da primeira onda da Covid-19 em solo brasileiro. Nesta semana, os governadores do Nordeste que compõem esse grupo de trabalho anunciaram a compra de 50 milhões de doses do imunizante russo Sputink V. De acordo com o presidente do Consórcio Nordeste, governador do Piauí Wellington Dias (PT), toda a quantidade comprada será destinada para a União aplicar no plano nacional de vacinação. Uma atitude alinhada ao pacto federativo, merecimento de aplausos.

Todavia, na contramão da CF/88, alguns gestores públicos comentaram em alguns veículos de comunicação que não vão aderir ao projeto da vacina da Sputink V pelo simples fato de não concordar que a distribuição seja realizada pelo Ministério da Saúde. O fato é que tais atitudes escanteiam a importância da vacinação para todo o País, onde se privilegia uma determinada região. O mérito da aquisição da vacina russa deve ser todo creditado ao Consórcio Nordeste e aos seus membros,  pela via reflexa, como também deve ser corado com louvor o entendimento acerca do encaminhamento de toda a compra para a pasta da saúde nacional. Um exemplo de federalismo, repise-se!

Para os que buscam um holofote eleitoral em meio à essa hecatombe sanitária mundial, não é a oportunidade ideal de se ter o “seu” DNA para a cura ou a redução da transmissão do novo coronavírus, ao menos. Com dito, a Constituição Federal de 1988 é inconteste e inelutável no que tange à sua forma federativa. Aos Estados, Municípios e ao Distrito Federal cabe sim a sua liberdade administrativa dentro do balizamento delineado pela nossa Lei Maior (CF/88). Questões de competência para atuar no enfrentamento à pandemia, já muito discutido e decidido no Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu o direito dos entes federativos em discordar de normas do Governo Federal.

Assim, sinalizo aqui para os que desprezam a unidade da nação brasileira, que tal entendimento da Corte constitucional brasileira não deve ser interpretado como direito à compra isolada das vacinas e seu uso segregatório, reservando as benesses dos imunizantes tão somente à parte da população brasileira.

Na última quarta-feira, 11, o presidente Bolsonaro sancionou a Medida Provisória (MP) 1026/21, que facilita a compra de vacinas, insumos e todo serviço necessário para a vacinação da Covid-19. A MP foi transformada na Lei 14.124/221, onde o seu texto diz claramente que a aplicação dos imunizantes deve seguir obrigatoriamente o Plano Nacional de Operacionalização da Vacinação elaborado pelo Ministério da Saúde.

Com uma decisão do STF autorizando a compra de vacina por laboratórios internacionais de alto renome sem a chancela do seu registro junto à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), muitas instituições e alguns estados lançaram-se em suas aquisições autônomas nas últimas semanas. Em contraponto, a Advocacia-Geral da União ingressou com ações junto à Justiça Federal com a finalidade da prevalência das diretrizes determinada pelo Plano Nacional de Vacinação.

Na última sexta-feira (11), o presidente do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), desembargador Ítalo Fioravanti Sabo Mendes, suspendeu duas liminares concedidas em primeira instância que permitia a importação das vacinas e sua aplicação aos membros da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages), como também aos cadastrados no Sindicato de Transporte Privado Individual por Aplicativos no DF (SINDMAAP), independentemente de uma validade mínima pela Anvisa.

Atualmente, está sendo discutido no Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB nacional) a compra de imunizantes para os advogados e advogadas inscritos junto à entidade de classe. Aqui, entendo ser desmedida também a perseguição pela imunização de poucos, quando em sua missão institucional e constitucional, a OAB deve defender a democracia e o bem estar da sociedade em geral.

Diante desse efeito devastador na vida de todos os brasileiros e na economia nacional, é mais do que bem-vinda a participação e ajuda da sociedade civil quanto à compra dos fármacos contra o novo coronavírus e suas variantes. No entanto, chamar para os seus os benefícios da vacina da Covid-19 e preterindo-se a essência do pacto federativo, desnatura a nossa forma de Estado. O resultado, se assim seguir, será tão desastroso quanto aos impactos da pandemia, onde teremos castas e clãs vacinados e uma imensa população pobre e miserável desassistida. Nesse caminhar, maculamos a Constituição Federal de 1988 em toda sua completude. Avalio.

O Brasil quer vacina e para todos, onde a sociedade civil e entes federativos devem obediência plena ao princípio humanitário da universalização da saúde e preservação da vida.

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