A extrafiscalidade da tributação no crédito de carbono, por Frederico Cortez

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Frederico Cortez é advogado, sócio do escritório Cortez & Gonçalves Advogados Associados. Especialista em direito empresarial. Cofundador do Instituto Cearense de Proteção de Dados- ICPD-Protec Data. Consultor jurídico no portal Focus.jor desde 2017. Escreve aos fins de semana. E-mail: advocacia@cortezegoncalves.adv.br / Instagram: @cortezegoncalveadvs.

Por Frederico Cortez

A questão ambiental vem sendo o principal tom adotado em reuniões de cúpula pelo globo terrestre, tanto de natureza política, como também em fóruns de economia. O Brasil pelo fato de ser considerado um dos grandes e poucos biomas no mundo, vem sendo cobrado por uma legislação específica como forma de viabilizar internamente o mercado de créditos de carbono.

A Constituição Federal de 1988 defende em seu art. 225 que é um direito de todos os brasileiros ter um meio ambiente ecologicamente equilibrado, com a adoção de medidas de proteção e prevenção da natureza. O ano de 1997 foi um marcador para a instituição de uma cultura ambiental entre os países ditos do primeiro mundo e os em estágio de desenvolvimento, com as assinaturas do Protocolo de Quito e da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre mudança do Clima.

Em resumo, esses dois conjuntos de obrigações mútuas estabelecem que os países desenvolvidos têm que reduzir a sua emissão de gases poluentes no percentual de 5%, com a implementação de algumas ações, tais como: reforma do setor energético e do setor de transporte, uso de fontes de energia renovável; redução das emissões de metano; combate ao desmatamento; proteção das florestas, promoção de formas sustentáveis de agricultura e cooperação entre os países para a disseminação de informações acerca de novas tecnologias.

Quanto aos países em desenvolvimento, restou o compromisso contínuo de alimentar um banco de dados com as informações sobre os níveis de poluição e de também comunicar sobre as medidas tomadas para fins de evitar a produção antrópicas de gases de efeito estufa (GEEs) na atmosfera.

Desde então, ficou estipulado que os países signatários de tais acordos estariam autorizados a precificar os gases regulados, bem como a transacionar entre si os certificados de redução. O Brasil tem sua participação garantida nesse novo mercado através do mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL), onde pode negociar as reduções de GEEs, conhecida como Reduções Certificadas de Emissão (RCEs) com os países desenvolvidos. Assim, gera-se o crédito de carbono.

Para o mercado de crédito de carbono se institucionalizar de vez em solo brasileiro, há a necessidade de regulamentar com a apresentação de uma proposta tributária viável para a sua execução. Muito se tem discutido, sobre qual seria a melhor forma de se tributar as receitas advindas com o crédito de carbono, independentemente se a transação for entre empresas, pessoas físicas, governos ou até mesmo entre países. Isenção de tributos ou a criação de uma espécie tributária para o crédito de carbono de natureza retributiva?

Caso a via eleita seja por meio da tributação pela forma de imposto, a mens legis do art. 225 da CF/88 em par com os acordos internacionais restarão desnaturados justamente porque não haverá uma sustentabilidade na aplicação dos recursos oriundos do crédito de carbono para o seu propósito. Seja qual for a espécie tributária do imposto escolhida (IRPJ, IOF, ICMS, ISS ou outros) para incidência sobre o mercado de créditos de carbono, não deriva para o enunciado entabulado no princípio da retributitividade, pois dessa forma inexiste a obrigatoriedade da utilização de toda receita tributária para fins da preservação e proteção ambiental.

Nesse caminhar acima descrito, a extrafiscalidade fica escanteada por não atender a sua missão que escapa à natureza arrecadatória do tributo. Essa faceta (extrafiscalidade) da tributação tem como meta incentivar a efetividade dos resultados de natureza político-econômico-social, bem como dar a devida sustentabilidade a esse mercado de ativo ecológico. Assim, os comandos dados pelo Protocolo de Quioto e pela Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre mudança do Clima não priorizam o efeito imediato do mercado de créditos de carbono e sim, entendem ser certo o continuísmo linear da aplicação destes recursos numa política ambiental.

Atualmente está tramitando o Projeto de Lei 528/2021 na Câmara dos Deputados que cria o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), previsto na Política Nacional de Mudança do Clima (Lei 12.187/09). No caso, o art. 8º do referido PL que versa sobre esse novo ativo ambiental diz que “as pessoas jurídicas de direito privado ficam isentas de pagamento dos tributos federais PIS, COFINS e CSLL nas transações nacionais no mercado voluntário de créditos de carbono”. Ora, mas isso vai contra a dinâmica da extrafiscalidade direcionada para a tributação ambiental.  Aplicar a isenção de tributos no mercado de créditos de carbono é desviar de um dos seus focos, que é a providência de recursos financeiros para a preservação e proteção do meio ambiente.

O grande equívoco de muitos é tratar a extrafiscalidade como um regime de exceção fiscal, tão somente vocacionada a se buscar a eficácia dos interesses sociais, políticos ou econômicos. Vai muito além, haja vista que a sua finalidade é atingir o grau de viabilidade de todo o sistema, harmonizando assim a convivência entre natureza e crescimento econômico.

A Constituição Federal de 1988 é considerada uma das mais prolixas dentre os documentos que regram os países democráticos. A sua farta e exacerbada carência de tudo ser positivado e aprovado pelas duas casas legislativas (Câmara dos Deputados e Senado Federal), abre um enorme campo de questionamentos e interpelações judiciais. Neste atual contexto de insegurança e confusão legislativa inerente ao mercado de créditos de carbono, o que certamente espelha para a insegurança jurídica quanto à falta de uma lei clara e específica,  o encurralamento  para as últimas fileiras de países descomprometidos com o meio ambiente será o destino final do Brasil.

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