Para que serve uma Universidade? Por Paulo Elpídio de Menezes Neto

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[Ou com quantos paus se faz uma canoa, digo, uma universidade de Harvard?]

“Não sou contra entrar na universidade, mas não deixe isso atrapalhar os seus estudos”, Mark Twain

“I find that the tree administrative major problems on a campus are sex for the students, athletic for the alumni and parking for the faculty”, Clark Kerr

“A ideia da universidade moderna é a de uma cidade– a cidade de uma indústria — com a sua oligarquia intelectual. A ideia da “multiversidade” é de uma cidade de infinita variedade”, Ckark Kerr – “Os Usos da Universidade”, Ediçoes UFC, Fortaleza, 1982.

Somos um país capaz de levar a criatividade ao extremo da insensatez. Desde que a “ideia de universidade” (Cardeal Newman) a libertou da autoridade dos monastérios na Alta Idade Média, ela passou a significar pluralidade de campos no plano do conhecimento e do saber.

A noção de “universidade especializada” é, portanto, um contrassenso: nega a universalidade que a caracteriza e os multiplanos que constituem a multiversidade. No Brasil, as leis mantiveram, como em outros lugares onde a universidade floresceu, a concepção de um espaço no qual ensino e pesquisa estão intimamente associados.

Dessa multiversidade de saberes, como lembrava Kerr, alimenta-se toda a sociedade — inclusive em aplicações específicas da ciência e da tecnologia. É nesse espírito que a universidade deve ser entendida.

Quando surgem denominações como “universidade dos esportes”, “universidade católica”, “metodista”, “indígena”, “da negritude” ou “popular”, vemos batismos ideológicos que se afastam do conceito original. Ao ceder à imaginação desmedida, corremos o risco de banalizar a instituição — amanhã poderíamos inventar até uma “universidade do carnaval” ou “de gênero”, reflexo mais de hesitações identitárias do que de compromisso com o saber.

Essa inclinação para o lúdico tem raízes fundadoras: somos um povo que dissolve a circunspecção em brincadeira, jeitinho e ironia. Trazemos respostas prontas antes mesmo de entender as perguntas. Nosso gracejo disfarça uma desinformação benévola sobre o essencial.

A universidade chegou tardiamente ao Brasil. Enquanto a República Dominicana criava a sua em 1551, só tivemos experiências embrionárias em 1912, com a Universidade do Paraná. A do Rio de Janeiro surgiu em 1920 e a de São Paulo, em 1934, foi a primeira a se aproximar de um modelo acadêmico consistente. Não raro, criamos universidades para usos banais, como outorgar doutorados honoris causa a monarcas de passagem.

A universidade brasileira é uma ideia importada, trazida por poucos que se aventuravam no mundo europeu. Tornou-se instrumento poderoso para romper grilhões da fé e do absolutismo. Mas, no Brasil, sua consolidação foi lenta, marcada por reformas, interesses políticos e enquadramento estatal.

Na década de 1960, já havia universidades em todas as capitais. Ainda assim, mais de um século após sua importação, a experiência segue inacabada, marcada por contradições. Em vez de se firmar como consciência crítica e polo de pensamento político sólido, a universidade deixou-se dominar por inclinações ideológicas incômodas e persistentes.

Um dia, espera-se, os tempos purgarão essa onda totalitária em que nossa Alma mater parece submergir. Seja pela vontade de Deus, seja pelo consenso dos homens e mulheres, resta-nos aguardar.

Não custa pagar para ver.

Paulo Elpídio de Menezes Neto é articulista do Focus, cientista político, membro da Academia Brasileira de Educação (Rio de Janeiro), ex-reitor da UFC, ex-secretário nacional da Educação superior do MEC, ex-secretário de Educação do Ceará.

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