O que aconteceu
Pesquisadores do Laboratório Europeu de Biologia Molecular (EMBL), do Centro Alemão de Pesquisa do Câncer e da Universidade de Copenhague desenvolveram uma ferramenta inédita: o Delphi-2M, um modelo de inteligência artificial generativa capaz de prever, com base em históricos médicos e fatores de estilo de vida, o risco de uma pessoa desenvolver mais de 1.000 doenças diferentes.
O estudo, publicado na revista científica Nature, mostra que o sistema foi treinado e testado com dados anônimos de 2,3 milhões de pacientes:
- 400 mil do Biobank do Reino Unido;
- 1,9 milhão do Registro Nacional de Pacientes da Dinamarca.
Como funciona
- O modelo identifica “eventos médicos” na vida do paciente, como diagnósticos anteriores, uso de álcool, tabagismo, obesidade, idade e sexo.
- A partir disso, calcula probabilidades de doenças futuras e até quando elas podem aparecer.
- Os riscos são apresentados em formato de previsão — como se fosse uma “chance de 70% de chuva”, mas aplicada à saúde.
- Além disso, pode simular trajetórias de saúde futuras, criando cenários para os próximos 10 a 20 anos.
Por que importa
Até hoje, as ferramentas de predição mais conhecidas, como o Qrisk (usado para calcular risco de infarto ou AVC), analisavam doenças isoladas. O Delphi-2M rompe essa barreira: consegue avaliar todas ao mesmo tempo, de forma integrada, com precisão comparável aos melhores modelos específicos.
Isso abre caminho para uma medicina proativa e personalizada, permitindo que médicos:
- Antecipem riscos de doenças em larga escala;
- Indiquem medidas preventivas específicas;
- Planejem tratamentos com mais antecedência.
No nível coletivo, governos e sistemas de saúde podem prever carga de doenças futuras e estruturar políticas de prevenção, especialmente em países com pressão sobre hospitais e recursos públicos — como o Brasil.
O que dizem os cientistas (The Guardian)
- Tomas Fitzgerald (EMBL-EBI): “Nosso modelo aprende padrões médicos e consegue prever resultados futuros de saúde.”
- Ewan Birney (diretor interino do EMBL): “No futuro, o clínico poderá mostrar ao paciente quatro grandes riscos e duas ações práticas para mudar esse cenário. Essa é a medicina personalizada que queremos criar.”
- Moritz Gerstung (Centro Alemão de Pesquisa do Câncer): “Este é o início de uma nova forma de compreender a saúde humana e a progressão das doenças.”
Vá mais fundo
O Delphi-2M representa um paradigma duplo:
- Científico: aplica conceitos de grandes modelos de linguagem (LLMs) ao universo da saúde, provando que padrões médicos podem ser decodificados em larga escala.
- Político e ético: exige debates urgentes sobre privacidade de dados, uso seguro de informações pessoais e acesso equitativo à tecnologia — para que não se torne um privilégio restrito a países ricos ou sistemas privados.
👉 A mensagem central: estamos diante de uma mudança estrutural na medicina. Se adotada de forma ética e inclusiva, essa IA pode transformar consultas médicas em verdadeiras “previsões de futuro”, dando ao paciente a chance de intervir antes que a doença se manifeste.