
A reação dura de Michelle Bolsonaro no Ceará não veio do nada. Por trás da crítica à aliança do PL com Ciro Gomes existe um calo político e pessoal que ela não esconde — e que pode ajudar a explicar o tom adotado em Fortaleza.
Michelle tem mágoa de Ciro desde 2022. Na época, o ex-governador, ainda no PDT, foi um dos padrinhos da ação no TSE que levou Jair Bolsonaro à condenação e à inelegibilidade por oito anos. A peça girou em torno da famosa reunião do então presidente com embaixadores, marcada por ataques às urnas eletrônicas.
Ciro comemorou a decisão do Tribunal:
“Fez-se justiça! Quando nós do PDT pedimos providências ao TSE, queríamos proteger a democracia e punir o abuso de poder político praticado por Bolsonaro. Bolsonaro inelegível por império da lei”, escreveu em junho de 2023.
E completou, numa segunda estocada:
“O que espero é que, de hoje em diante, tenhamos os brasileiros direito de cobrar de nosso governo mudanças profundas na vida política e econômica do Brasil, sem o oportunismo de a tudo termos que engolir porque senão… ‘Bolsonaro voltaria’.”
Não é pouca coisa. Para o núcleo bolsonarista, a inelegibilidade do ex-presidente é uma ferida aberta. Para Michelle, mais ainda — e justamente por isso, ela viu como “precipitado” o movimento de André Fernandes em direção a Ciro no Ceará.
A entrada de Flávio Bolsonaro no caso, dizendo que Michelle “atropelou” a articulação do PL local, adiciona uma camada de ironia a essa história: a disputa interna do bolsonarismo no Ceará agora envolve também quem tem o direito de perdoar (ou não) o algoz do clã.
Enquanto Flávio fala em “tapar o nariz” para alianças táticas e “enfraquecer Lula e o PT no Nordeste”, Michelle parece manter um critério mais… sensorial. Para ela, Ciro não é apenas um adversário político: é o responsável direto pela condição que mais limita o bolsonarismo hoje — a impossibilidade de Jair Bolsonaro disputar eleições.
O jogo no Ceará passa, portanto, por um detalhe nada trivial: para Michelle, não é apenas estratégia. É memória. É ferida. É calo.






