Por Frederico Cortez
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A Lei 8.245/91 que rege a relação entre locador e locatário estabelece as condições para a legalidade do referido negócio jurídico. Via de regra, contumaz em contrato locatício é definição do valor mensal inerente ao aluguel do espaço comercial pelo inquilino (pessoa jurídica). Infere apontar, que a própria Lei do Inquilinato está amoldada pelo princípio da autonomia privada, que se traduz na liberdade contratual apoiada em três pilares: escolha do contrato, aceitação do contratante e conteúdo livre. Este tripé deve ter a chancela da legalidade, forma prescrita em lei e objeto lícito.
Hodiernamente, o contrato locatício paritário ao faturamento empresarial vem ganhando contornos robustos, em razão dos efeitos negativos aplacados pelo novo coronavírus. Com a decretação do estado de quarentena pela maioria dos governadores estaduais, inafastável foi o recuo abrupto e brusco no faturamento das empresas. Com demissão em grau elevado já se operando, alguns empreendedores buscaram a via da antecipação de férias como uma forma de atenuar essa amargura. O que não será o suficiente, infelizmente!
Em atual situação adversa e imprevista, tanto pelo locador como pelo locatário, um modelo de contrato locatício vem ganhando força como forma de manter a continuidade empresarial nesta difícil fase. Trata-se do contrato de locação paritário ao faturamento do empreendimento, que já é praticado em parte nas locações de espaço comerciais em shopping centers. Assim, diante desse cenário recheado de imprevisibilidade e incertezas quanto ao fim da quarentena e até mesmo ao retorno do crescimento da economia, a realidade é um solo fértil para a revisão contratual, devendo o valor do aluguel passar a ser ancorado no faturamento da empresa. Impende destacar que, nessa nova convenção também se fazem mais do que presentes os princípios da probidade e boa-fé, elencados no art. 422 do Código Civil de 2002.
Do antigo formato conservador, agora o contrato de locação está em trânsito para um modelo flutuante e que cause menos prejuízos para os dois lados. Existência de risco nesse formato proposto? Sim, como em todo empreendimento e em escala maior com o coronavírus. Todos irão perder, fato! A observância deve estar em manter-se em atividade, produzindo e gerando renda (riqueza), nem que seja em um quantitativo aquém ao já acostumado.
Como já escrevei em outros artigos (Aqui e Aqui), não só o campo político, econômico e social está em mutação, pois a justiça também terá que se ajustar ao delicado e passageiro momento. Na noite da última sexta-feira,3, o Senado Federal aprovou em votação simbólica e por meio de videoconferência, o PL 1179/2020 de autoria do senador Antônio Anastasia (PSD/MG) e relatoria da senadora Simone Tebet (MDB/RS). Tal projeto de lei, na prática alterou substancialmente as relações jurídicas de Direito Privado até então vigentes no país. No bojo, as mudanças foram nas searas de relação de consumo, contratual, locação de imóveis urbanos, contratos agrários, condomínios edilícios, regime societário, concorrência empresarial, família e sucessões e proteção de dados. Ou seja, podemos falar em um “novo direito” para as novas condições imprevistas imposta pelo COVID-19.
Nesse habitat de sobrevivência pelo empreendedor, a regra de ouro é reinventar-se e ajustar-se. Inadimplir não é um verbo a ser praticado em nenhum período da vida empresarial, quanto mais agora. O caminho a ser adotado é de união, pois locador e locatário não são partes inimigas e nem antagônicas, e sim pertencentes a um só organismo (negócio), numa verdadeira relação de simbiose. Uma depende diretamente da outra, simples assim. Verdade já no mercado, com a posição da rede de fast-food MadDonald’s em renegociar os contratos de locação das unidades do Brasil com base no faturamento de cada operação. De acordo com a Arcos Dorados Holdings Inc., maior operadora de franquia da cadeia de restaurantes estadunidense, o valor do aluguel será proporcional ao faturamento. Um Norte a se seguir. Aconselho!
A revisão contratual em locação empresarial em tempos do Coronavírus é um caminho sem volta. As condições ora estabelecidas anteriormente à pandemia (pacta sunt servanda), não se reveste mais de razoabilidade e nem de proporcionalidade desde o mês passado. No direito, havendo elementos com força mínima para mudar a realidade do negócio jurídico, tem-se a força maior ou caso fortuito como guias autorizadoras para imprimir novas cláusulas contratuais com base nas condições como assim se apresentam no momento da pandemia, resultante da aplicação da Teoria da Imprevisão (rebus sic stantibus).
A advocacia a vigorar a partir de então, deve ser a do diálogo e não a do embate. Mediação e conciliação é o novo caminho a trilhar pelos locadores e locatários. O tempo nunca foi tão precioso como agora, o velho jargão de que “tempo é dinheiro”, deve suportar a releitura para “tempo é vida”. Não só a vida empresarial, mas vida de pessoas, vida da economia, vida da sociedade, a vida de todos nós!