O risco fiscal voltou a dar as cartas no mercado de câmbio doméstico neste início de semana e levou o dólar a se aproximar novamente do nível de R$ 5,00. Plano do governo Lula de incentivo à indústria da ordem de R$ 300 bilhões, dos quais R$ 250 bilhões via BNDES, avivou temores da volta dos chamados incentivos parafiscais e de piora das contas públicas.
Analistas ouvidos pelo Broadcast chamam a atenção para o fato de o lançamento da nova política industrial ocorrer justamente no momento em que o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, encontra obstáculos na agenda de recomposição de receitas – o que faz o cumprimento da meta fiscal de déficit primário zero neste ano parecer cada vez menos factível.
O desconforto com o quadro doméstico era patente já pela manhã. O dólar abriu em alta e superou o nível de R$ 4,95 ainda na primeira etapa de negócios, mesmo com sinal predominante de baixa da moeda americana no exterior. Ao longo da tarde, quando o dólar passou a subir na comparação com divisas emergentes e de países exportadores de commodities, a divisa renovou sucessivas máximas, alcançando no pico R$ 4,9925.
No fim do dia, o dólar à vista subia 1,23%, cotado a R$ 4,9873 – maior valor de fechamento desde o dia 31 de outubro de 2023 (R$ 5,0414). Com a arrancada de hoje, a moeda passa a acumular valorização de 2,76% em janeiro. A liquidez foi forte para uma segunda-feira, com o contrato de dólar futuro para fevereiro – principal termômetro do apetite por negócios – movimentando mais de US$ 13 bilhões.
O head da Tesouraria do Travelex Bank, Marcos Weigt, observa que o real perdeu bem mais que moedas pares e de exportadores de commodities, como peso mexicano e os dólares australiano e canadense. “Esse pacote de incentivos à indústria da ordem de R$ 300 bi com uso do BNDES traz preocupação com o parafiscal”, afirma Weigt, ressaltando que a notícia pegou o mercado em uma posição técnica mais frágil, com muitos fundos locais vendidos em dólar, o que deve ter provocado uma onda de ordens para zeragem de posições e limitação de perdas (stop loss).
Chamada de “Nova Indústria Brasil”, o programa de apoio à política industrial terá R$ 300 bilhões até 2026, dos quais R$ 250 bilhões via BNDES. Cerca R$ 100 bilhões já haviam sido anunciados em julho do ano passado, na primeira reunião do Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI)
“O real apanhou bastante na sessão. O principal catalisador foi o programa de neoindustralização com incentivo do BNDES. Mas parece que há mais fumaça que fogo. Esse tipo de programa costuma ser uma junção de vários projetos e incentivos já em andamento. É bem difícil que haja muito dinheiro novo”, afirma o economista Paulo Henrique Duarte, da Valor Investimentos.
Do lado das receitas, a equipe econômica enfrenta contratempos. Fontes afirmaram ao Broadcast Político que Haddad deixou reunião com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), na semana passada sem apoio à proposta de reoneração da folha de pagamentos. Lira também teria se oposto ao fim do no Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), que isenta o setor de uma série de tributos.
Entre indicadores, a Secretaria de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) informou que a balança comercial brasileira registrou superávit comercial de US$ 1,013 bilhão na 3ª semana de janeiro (dias 15 a 21). No mês, o superávit acumulado é de US$ 4,471 bilhões.
Sem impacto no câmbio no curto prazo, o Tesouro brasileiro teria fechado hoje captação de US$ 4,5 bilhões com emissão de bonds de 10 e 30 anos, em meio a uma demanda que já superava US$ 13 bilhões, segundo fontes ouvidas pelo Broadcast.
Agência Estado