
A Hapvida construiu seu império atendendo a base da pirâmide social. Hoje, mais de 95% dos 8,8 milhões de beneficiários da operadora estão na baixa renda e na classe média. Mas a empresa cearense quer mudar de patamar. Seu novo alvo: os clientes que hoje frequentam os corredores do Hospital Israelita Albert Einstein e do Sírio-Libanês, ícones da medicina privada na América Latina.
O plano é ousado. A operadora lançou o conceito Hapvida Advance, inaugurando um ambulatório premium na Avenida Brigadeiro Luís Antônio, em São Paulo. Hotelaria diferenciada, concierge, equipamentos de ponta, localização estratégica e corpo clínico qualificado compõem a receita para seduzir o público da elite. O investimento inicial foi de R$ 35 milhões, com possibilidade de chegar a R$ 50 milhões.
A matemática do premium
No universo da Hapvida, apenas 4% dos beneficiários usam produtos voltados à alta renda, mas eles respondem por 10% da receita. Faz sentido: enquanto um cliente básico desembolsa cerca de R$ 270 por mês, o premium paga em torno de R$ 800.
Capturar esse público é mais do que um desejo de diversificação. É uma estratégia de defesa: aumentar a margem em um mercado cada vez mais pressionado por custos, judicialização e regulação.
Novos hospitais em São Paulo
O passo seguinte vai além do ambulatório. A companhia projeta dois hospitais premium na capital paulista:
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Hospital Ibirapuera: 250 leitos, foco materno-infantil e alta complexidade. Investimento previsto: R$ 405 milhões.
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Hospital Antônio Prudente: também com 250 leitos, voltado à oncologia e à altíssima complexidade. Aportes de R$ 410 milhões.
Somados, os dois projetos consomem R$ 815 milhões. Eles fazem parte do pacote de R$ 2 bilhões em investimentos da Hapvida até 2026. Do total de 11 hospitais previstos, três são premium e oito seguirão atendendo o público tradicional.
O dilema da marca
O maior obstáculo não está no capital. É simbólico. A Hapvida nasceu e cresceu como operadora popular. Mudar essa percepção será um trabalho de longo prazo. Como convencer um cliente que já confia em Einstein e Sírio-Libanês a migrar para uma empresa associada à saúde popular?
“Sabemos da importância nacional e mundial desses hospitais, mas a nossa ideia é ser, sim, uma opção para os usuários de alta renda das redes hospitalares com hotelaria diferenciada e com serviços de extrema qualidade”, disse Jorge Pinheiro, CEO da Hapvida, ao Neofeed.
O Rio de Janeiro no alvo
A estratégia premium não se limita a São Paulo. O Rio de Janeiro também entrou no radar. A Hapvida anunciou um pacote de R$ 380 milhões: um hospital de 250 leitos, três prontos-atendimentos e duas clínicas. O movimento busca elevar sua fatia de mercado, hoje tímida: 6,6%, contra os quase 20% de São Paulo.
Outro passo foi a compra do Hospital de Oncologia do Méier, por R$ 5,3 milhões. Pequeno no financeiro, mas relevante simbolicamente: sinaliza ambição no território dominado pela Rede D’Or, que reforçou sua liderança em 2022 ao adquirir a SulAmérica.
Menos processos, mais resultados
A Hapvida também tenta deixar para trás um fantasma: a judicialização. Em 2023, os bloqueios judiciais chegaram a R$ 869 milhões. Agora, os valores estão estabilizados em torno de R$ 825 milhões, abaixo das projeções de analistas.
A melhora ajudou no balanço: no 2º trimestre, a receita líquida atingiu R$ 7,67 bilhões (+7,3% em relação a 2024). O Ebitda caiu 26,6%, para R$ 703 milhões, mas a empresa ganhou 57,7 mil novos beneficiários. Na B3, a ação acumula alta de 24,3% em 2025, embora ainda some queda de 40% nos últimos 12 meses.
O recado final
A Hapvida mantém sua base popular como prioridade, mas a aposta no segmento premium sinaliza um esforço de diversificação importante. Com novos hospitais em São Paulo e investimentos no Rio de Janeiro, a companhia busca ampliar sua presença em mercados estratégicos. O resultado dessa movimentação dependerá da capacidade de conciliar a tradição construída na saúde de massa com a exigência de qualidade percebida pelos clientes de maior poder aquisitivo.
Fonte: Neofeed