Louvada seja Santa Genoveva, nascida em Nanterre, a virgem padroeira de Paris (e eu me pergunto por que não existe a palavra madroeira); hosana nas alturas a São José Vaz, nascido no século XVI no antigo Ceilão, atual Sri Lanka, o primeiro indígena beatificado; homenagens a Santo Antão, que ao se ver órfão doou aos pobres o restante de seus bens, antes de se retirar para o deserto, onde viveria em ascese e oração, lutando embora contra o demônio e as tentações que inspirariam o assombroso tríptico de Hyeronimus Bosch, exposto em Lisboa; homenagens ao nosso conhecido São Sebastião, alto oficial a serviço
do exército romano, que ao se revelar cristão foi torturado com flechas antes de ser morto pela força de açoites (triste final da história dele, que eu desconhecia); que seja lembrado o nome de Santa Marcela, discípula de São Jerônimo, matrona romana de ilustre família, assassinada durante o ataque dos visigodos (que me traz de volta as aulas de História onde tentávamos, em vão, aprender as diferenças entre godos, visigodos, e ostrogodos); um viva a Santa Ludovica Albertoni, viúva romana, ocupada em trabalhar pela educação das jovens vulneráveis, e que seria imortalizada, no êxtase da morte, em prodigiosa escultura de Gian Lorenzo Bernini, capaz de converter a dureza do mármore no mais delicado tecido; saudações a São Brás, o orago dos otorrinolaringologistas, merecedor da
santificação por haver curado, a caminho de sua decapitação, uma criança que se engasgava, nos braços da mãe; glorificação à Santa Josefina Bakhita, do Sudão do Sul, escravizada aos 10 anos, e que após outros dez anos de intensos sofrimentos nas mãos dos homens foi levada, por mão divina, para a santidade na Itália; honras a Santa Bárbara, decapitada pelo próprio pai, que a seu lado cairia fulminado por um raio, fazendo dela a protetora contra as tempestades meteorológicas e emocionais; louvação a São Valentim, presbítero e mártir, degolado na segunda milha da Via Flamínia, onde tantas cabeças rolaram; glória a São João de Deus, abandonando sua casa em Portugal aos 8 anos de idade, seguindo para a Espanha onde combateria os turcos, e onde, ao retornar à vida civil, abriria uma biblioteca em Granada; vivas a São José, tão familiar a todos nós, e que, apesar disso, não é citado em nenhum dos quatro Evangelhos; louvor a Santo Expedito, martirizado na Armênia, costumeiramente representado com roupas militares, e que bem poderia ser o padroeiro dos que costumam adiar os próprios projetos (sua bota direita esmaga o corvo chamado Procrastinação: para o Santo, não havia o amanhã nas decisões, mas sim o hoje); parabéns a São Marcos, evangelista e navegador, padroeiro de Veneza,
e a Santa Marina, co-padroeira e dona de uma vida extraordinária, na qual se disfaçara de rapaz adolescente, para acompanhar o pai viúvo a um mosteiro, e que ao visitar um vilarejo com outros monges seria acusada de estupro, aceitando o bebê nascido da falsa denúncia (tudo isso para poupar a denunciante), tendo a verdade revelada somente após sua morte, ao ser seu corpo entregue aos que iriam sepultá-la; louvores a Santa Catarina de Sena, ostentando nas mãos e nos pés os estigmas sangrentos de Cristo;
salve São Vito, prodigioso na cura dos que sofrem de epilepsia, ou do estranho mal chamado coreia, ambos causadores de movimentos incontroláveis; preitos a São João Batista, com sua cabeça exposta sobre uma bandeja, os olhos mortos sustentando o olhar culpado de Salomé; louvada seja a visão de Santa Clara de Assis, falecida no ano de 1253, capaz de enxergar na noite de Natal, como se projetada na parede de sua cela, ritos natalinos celebrados bem longe dali, por isso mesmo ganhando do Papa Pio XII o título de padroeira da televisão; honra, por fim, a todos os santos e santas, anjos e arcanjos, querubins e serafins, que protegem e abençoam os que neles depositam sua Fé – sem rejeitar os que ainda buscam respostas, bem lembrados na justa curiosidade de Umberto Eco: “Em que creem os que não creem?”.