As agências de inteligência mais reputadas do planeta partem de um princípio claro, rastrear o caminho do dinheiro e cortar as comunicações. É pelo fluxo de recursos e pelo silêncio imposto às trocas que se descobre quem puxa as cordas. Por aqui a primeira etapa às vezes funciona, mas a segunda raramente vai adiante. O dinheiro é seguido até o limiar do flagrante, momento em que tende a evaporar como névoa sob o sol. Mexer nas comunicações é outra história, uma fronteira que muitos evitam atravessar por medo das consequências.
Vivemos num narcoestado onde o crime organizado trata as telecomunicações como se fossem pasta ministerial. Quando alguma autoridade ensaia puxar o cabo, recebe um aviso silencioso e recua. A última tentativa de adotar bloqueadores em presídios acabou em espetáculo de intimidação. Um veículo carregado com explosivos foi deixado à vista, cenário que basta para que os guardiões do poder retirem o pé do acelerador e aleguem prudência familiar como justificativa. Prudência pode ser virtude, pode também ser rendição.
Enquanto isso, os que ocupam gabinetes e plenários desfilam em carros blindados com seguranças ao lado e discurso inflamado na boca. Não se inibem de tocar no erário público, porque sabem que no país da impunidade se negocia solução para quase tudo. Consultorias, contratos e doações que viram patrimônio são sinais de uma lógica em que o risco maior é para quem paga. A obediência a grupos criminosos tornou-se, em muitos casos, uma formalidade aceita em nome da paz aparente.
O que fica por último é o povo. O cidadão comum continua à deriva, exposto à violência e à negligência. Manchetes anunciam que somos um dos países mais violentos do planeta, e no cotidiano a sensação é de impotência. A verdade é que a fragilidade institucional e a cumplicidade discreta alimentam um sistema que troca segurança por conivência.
Ainda existem, e felizmente, exceções honrosas. Há agentes públicos e investigadores que resistem, profissionais que trabalham com coragem e coerência, juízes que preferem a lei à conveniência. Esses poucos mantêm viva a possibilidade de mudança. Se quisermos recuperar a confiança, é preciso fortalecer instituições, proteger quem investiga e tornar inalienável a prioridade pelo bem comum. Até que isso ocorra, o reino do faz de conta continuará a prosperar, e o silêncio dos poderosos será a música que acoberta a vergonha da República.
