Equipe Focus
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Os desembargadores da Segunda Turma do Tribunal Regional do Trabalho do Ceará (TRT/CE) reconheceram o vínculo de emprego entre um motorista e a empresa de aplicativos de transportes Uber. No caso, o motorista relatou que prestou serviço para a Uber no período de dezembro de 2016 a setembro de 2017, e teria sido desligado da empresa após envolver-se em um acidente sem vítimas. A decisão confirma sentença da 9ª Vara do Trabalho de Fortaleza, que declarou ter havido despedida sem justa causa e obrigou a empresa a pagar verbas rescisórias ao trabalhador, como aviso-prévio, férias proporcionais, 13º salário proporcional e FGTS. A decisão foi unânime pelo colegiado da Corte trabalhista.
De acordo com os autos do processo, o motorista de aplicativo alegou que trabalhava das 8h às 23h, de segunda-feira a domingo, sem Carteira de Trabalho assinada. Ao ingressar com a ação trabalhista, ele pediu reconhecimento do vínculo de emprego e o consequente pagamento das verbas rescisórias. Em sua defesa, a empresa Uber enfatizou que não é uma empresa de transporte, e que o motorista não era seu empregado, mas trabalhava como autônomo. Seria apenas uma parceria comercial. Acrescentou ainda que é uma plataforma digital e que coloca em contato os motoristas autônomos que desejam prestar serviço de transporte e os usuários que desejam contratar referido serviço. Ao fim, a empresa disse que o descredenciamento do motorista aconteceu por descumprimento de regras contratuais.
Para o relator do processo no TRT/CE, desembargador Francisco José Gomes da Silva, a plataforma digital é na realidade um modelo organizacional de uma empresa. “O que se extrai do contexto fático-probatório, ao contrário do que defende a empresa acionada, é que seu objetivo social não se emoldura no conceito de uma simples plataforma digital, o que, a seu ver, a caracterizaria como uma empresa de tecnologia”. Continuou o magistrado, “o vínculo entre a reclamada e o autor é mantido por meio de um “contrato” virtual, onde a demandada dita todas as condições, cabendo ao motorista a aceitação, por adesão”, acrescenta. Segundo o desembargador, apesar de as atividades serem desenvolvidas com a utilização de plataformas digitais, empresas como a Uber não atuam no ramo da tecnologia, como costumam se enquadrar. “Na verdade, os serviços são organizados para que as plataformas digitais detenham amplo e absoluto controle”. Na decisão, o julgador observou que estavam presentes os requisitos que caracterizam uma relação empregatícia, como subordinação, pessoalidade, não-eventualidade e onerosidade. “Logo, de todo o exposto, evidente a atuação da demandada, muito além da simples aproximação de pessoas interessadas em contrato de transporte. Cabe ao Poder Judiciário traçar os limites do avanço tecnológico de modo a preservar a humanização do trabalho, a fim de inibir a desregulamentação dos direitos laborais”.
O acórdão da Segunda Turma do TRT/CE reafirma a sentença do magistrado da primeira instância da Justiça do Trabalho do Ceará, na qual reconhece o vínculo empregatício. Em sua decisão, o juiz Raimundo Dias de Oliveira Neto citou decisões de várias cortes internacionais, como dos Estados Unidos, da Inglaterra, da França e da União Europeia, todas no sentido de reconhecer que os motoristas da Uber trabalham efetivamente na condição de empregados.
Assim, o magistrado concluiu que o encerramento do contrato de trabalho foi sem justa causa e condenou a empresa a pagar aviso-prévio indenizado de 30 dias; férias proporcionais; 13º salário proporcional; FGTS de todo o período trabalhado, mais multa de 40%; além de outra multa prevista na CLT, pela falta de quitação das verbas rescisórias. Da decisão, cabe recurso.
Em nota enviada ao Focus, a Uber informou que irá recorrer da decisão 2ª Turma do TRT da 7ª Região. Segundo a empresa, a resolução “representa um entendimento isolado e contrário ao de outros casos já julgados pelo próprio Tribunal Regional e pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho) – o mais recente deles em maio”. Veja comunicado completo abaixo.
DECISÃO JUDICIAL UBER X MOTORISTA
Confira a nota completa enviada pela Uber:
“A Uber esclarece que vai recorrer da decisão proferida pela 2ª Turma do TRT da 7ª Região, que representa um entendimento isolado e contrário ao de outros casos já julgados pelo próprio Tribunal Regional e pelo TST (Tribunal Superior do Trabalho) – o mais recente deles em maio.
Nos últimos anos, as diversas instâncias da Justiça do Trabalho vêm construindo sólida jurisprudência confirmando o fato de não haver relação de emprego entre a Uber e os motoristas parceiros, apontando a inexistência de onerosidade, habitualidade, pessoalidade e subordinação, requisitos que configurariam o vínculo empregatício. Em todo o país, já são mais de 1.050 decisões de Tribunais Regionais e Varas do Trabalho neste sentido, sendo que não há nenhuma decisão consolidada que determine o registro de motorista parceiro como empregado da Uber.
Os motoristas parceiros não são empregados e nem prestam serviço à Uber: eles são profissionais independentes que contratam a tecnologia de intermediação digital oferecida pela empresa por meio do aplicativo. Os motoristas escolhem livremente os dias e horários de uso do aplicativo, se aceitam ou não viagens e, mesmo depois disso, ainda existe a possibilidade de cancelamento. Não existem metas a serem cumpridas, não se exige número mínimo de viagens, não existe chefe para supervisionar o serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa e não existe determinação de cumprimento de jornada mínima.
O TST já reconheceu, em quatro julgamentos, que não existe vínculo de emprego entre a Uber e os parceiros. No mais recente, a 5ª Turma considerou que o motorista “poderia ligar e desligar o aplicativo na hora que bem quisesse” e “se colocar à disposição, ao mesmo tempo, para quantos aplicativos de viagem desejasse”.
Em março, a 4ª Turma decidiu de forma unânime que o uso do aplicativo não configura vínculo pois existe “autonomia ampla do motorista para escolher dia, horário e forma de trabalhar, podendo desligar o aplicativo a qualquer momento e pelo tempo que entender necessário, sem nenhuma vinculação a metas determinadas pela Uber”. Entendimento semelhante já foi adotado em outros dois julgamentos do TST em 2020, em fevereiro e em setembro, e também pelo Superior Tribunal de Justiça em julgamento de 2019.”