A arte de nos renascer; Por Augustino Chaves

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Augustino Chaves
Especial para o Focus

Mãos e olhos, manifestações do espírito. Unidade tão nossa. Tão de cada um. Tão improvável. Potencializados pela evolução, que nos disponibilizou. Se cansados da linguagem, desenhar e colorir nos expressa, nos faz bem. “A mão diz coisas que não queremos dizer com as palavras” (George Steiner). E todos nós chegamos a esse
ponto, dotados de aptidão a colorir, a cantar, a dançar. Livremente. Performance para quê? Para quem? “Eu sou o que sou”.

Nilse da Silveira conduziu a Arte ao centro do tratamento dos atormentados, precedente que entrou à História. Médica, não se deixou destruir pela prisão na ditadura; retornou, em 1945, ao hospital psiquiátrico, no Rio, e não se intimidou com o contexto vigente, firme em sua determinação de tentar novos tratamentos.
Que colheram alentadores resultados.

Queria lhes transmitir a iniciativa que se segue: desenhos emanados de crianças em tratamento oncológico, aqui em Fortaleza, no Instituto Peter Pan, resultando em acervo de quase mil quadros, nos mostram, de pronto, que no meio das dores e das incertezas abriu-se pausa de abstração, de expressão, eventualmente alegria.

Os quadros são compostos por dupla de crianças. Uma inicia o desenho, por trinta segundos, segue-se-lhe a outra; e nova rodada: o quadro está pronto. É uma plataforma de pintura coletiva. Tem cores e pincéis, e outros recursos, à disposição do artista da vez.

Em particular, meus resultados utilizando o aplicativo, desenhando com outra pessoa, tomam forma mais viva do que quando individualmente. Surgem em outra natureza. A participação de outro transforma método e o conteúdo.

No caso, o mesmo ambiente acolhia aquelas crianças. Entretanto, a concepção desse sistema exibe sua aptidão exatamente no oposto disso: para que duas pessoas, estando em lugares diferentes, em diferentes culturas, em diferentes perspectivas, criem uma obra comum, basta abrir o aplicativo.

Então, multiplicam-se as duplas: crianças de continentes diferentes; pai com filho que mora fora; quadro pintado por palestino e judeu. Quadro pintado por torcedores de times adversários. Quadro pintado pela dupla Papa Francisco e Lula, a ser colocado em leilão. E por aí vai. Assim imaginou quem idealizou o sistema.

O artista plástico Alexandre Chaves com crianças e adolescentes da Associação Peter Pan, em dezembro de 2014.

Coloquei os olhos nesse singular acervo digital produzido no Peter Pan, quase mil quadros. Fixei-me em um deles, unidade de pungência e doçura. Havia sido produzido na UTI. As duas crianças que o desenharam haviam partido a outro plano.

Essa plataforma começou quando o artista plástico Alexandre Chaves, aos seus dezessete anos, resolveu passar duas tardes por semana pintando e colorindo na companhia dessas crianças. As crianças esperavam-lhe e não lhe era possível a atenção a todos.

Sua resposta foi a idealização dessa Plataforma. Era necessário recurso a sua materialização, para efetivar o algoritmo, dispor de computadores e outras providências.
O recurso inicial, cerca de cem mil reais, foi conseguido no final do Governo Cid Gomes. Fernando Costa e Arialdo Pinho rapidamente apoiaram, efetivamente. Agradeço, mais uma vez, a esses três destacados.

Acompanhei de perto, Alexandre é meu filho. Antes dele o encantador universo das artes plásticas era-me externo e distante, vivente atavicamente destinado a buscar a subsistência e entrar nessa nossa fila de se consumir nos assuntos que sabe-se lá quem
escolhe, nos esquemas e conceitos, o cotidiano-obrigação nosso de cada dia por décadas repetido até o dia de descansar no irrisório túmulo.

Hoje colore o meu calendário vagar pelos corredores dos museus, nutrir-me daquela profusão de arte. E salve o nossa Pinacoteca do Ceará! E salve as pinturas dos homens das cavernas! E Guernica foi salva dos nazistas, que tanta a odiavam! E salve todo esse
esplendoroso espelho da humanidade!

E assim vamos nos renascendo: nos filhos, nas novas gerações, nos livros, nas artes, nos projetos, nas inovações, nos impulsos, nos amigos, nas noites regadas a músicas e doses.

“E o que faremos agora? Plantemos rosas. E as rosas foram sugeridas”. (Geraldo Melo
Mourão).

Caros amigos, Carnaval já vem chegando. Devias vir…

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