Das rupturas e dos reencontros
A vida familiar, que nasce marcada pelo dom da comunhão, não está imune às rupturas. Entre pais e filhos, entre irmãos, a convivência humana pode se tornar palco de feridas que afastam corações antes unidos pelo mesmo sangue. As causas variam em forma e intensidade, mas quase sempre trazem o peso da incompreensão e do orgulho.
Há rompimentos que nascem da expectativa frustrada, quando os filhos não correspondem ao que os pais sonharam, ou quando os pais falham em oferecer a presença amorosa que os filhos necessitam. Outros decorrem da disputa por bens e heranças, onde o valor material obscurece o vínculo espiritual. Não menos frequentes são os embates alimentados por divergências políticas, religiosas ou de estilo de vida, que, em vez de se tornarem oportunidades de diálogo, transformam-se em muros de silêncio. E há também as mágoas guardadas em segredo, palavras duras que ecoam por anos, gestos impensados que ferem como lâmina e fazem do coração um terreno endurecido.
Mas, se a vida nos mostra que a ruptura é possível, ela nos ensina também que a reconciliação é necessária. A espiritualidade franciscana recorda que a fraternidade é mais forte do que qualquer conflito, porque nasce de Deus, que é Pai de todos. O espírito de São Francisco nos convida à humildade e ao despojamento: abrir mão da vaidade e do orgulho é o primeiro passo para reencontrar o outro. A reconciliação começa na escuta silenciosa e no reconhecimento da própria falha.
São Tomás de Aquino, ao refletir sobre a ordem do amor, lembra que a caridade deve começar pelos que estão mais próximos de nós. Não amar os que partilham a mesma vida e a mesma origem é ferir a própria natureza. A reconciliação, portanto, não é apenas um ato de bondade, mas de justiça: restituir ao outro o lugar que lhe é de direito no nosso coração.
O perdão abre espaço para que o tempo cure as feridas e a memória dos pais, vivos ou já na eternidade, inspire o reencontro. O vínculo de sangue é semente que nunca se perde, ainda que soterrada por ressentimentos. Ao se permitir a reconciliação, redescobre-se que o essencial não está nas razões que dividiram, mas no amor que permanece como herança maior.
Rompimentos existem, mas não são palavra final. A vida espiritual aponta sempre para a esperança. Onde houver orgulho, que haja humildade. Onde houver silêncio, que nasça o diálogo. Onde houver mágoa, que floresça o perdão. Porque no fim, como recorda a sabedoria dos santos, a fraternidade é caminho de salvação, e a reconciliação é a face mais luminosa do amor.