As redes sociais vão-se despovoando aos poucos. As intervenções mais frequentes — as postagens que atraíam os frequentadores do lugar — rareiam. Do que restou, prevalecem textos aborrecidos, grosseiros, intempestivos, carentes de espírito, injuriosos por vezes.
Antes mesmo de entrar em vigor a assepsia das conveniências explícitas — apenas anunciada pelos vigilantes da ordem — as pessoas começaram a bater em retirada. Algumas refugiaram-se nos links dos gourmets; outras, falam de vinhos; outras mais atacam de YouTube com velhas canções esquecidas.
Tentei, por prudência, recolher-me a um encosto bem protegido. E puxar conversa com uma criatura bem aprovisionada de fé — teólogo de formação, de preferência — a ver se conseguia expulsar velhos impulsos e persignações que já julgava mortos neste invólucro de oitent’anos bem servidos.
Indo as coisas como vão, com a deserção das criaturas de boa índole intelectual, temo ficar a conjecturar, sozinho, sobre certezas antigas e coisas irrelevantes — ou na companhia de interlocutores desconhecidos que, não sei por que razão, deram de aparecer com mais frequência por estes lados da Internet.
Isto posto, lembro-me da reação de dois presidentes em fim de governo: um, general, a pedir que o esquecessem; o outro, um oligarca nordestino a implorar: “Não me deixem só”…
Lembrei-me, por puro acaso, de uma noite passada em Paris, em companhia de João Clímaco Bezerra, conferindo em solidária desobriga alguns bistrôs tardios pela Place Blanche. Entramos num velho zinc modorrento, com uma mesa posta para muitos jovens e um homem de idade.
Na roda, todos riam alegremente. Percebi, entretanto, que se comunicavam por sinais. O silêncio trazia para o lugar uma estranha aura de cumplicidade mística. Eram todos surdos-mudos.
A prudência do silêncio é um amargo paradoxo: só se torna inútil quando as pessoas, não podendo falar — calam-se.
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