O Tempo em Camadas e um instante que se eterniza; Por Pádua Sampaio

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Imagem de um dos momentos do evento cultural abrigado na casa de Patrícia e Amarílio Macêdo. Imagem: Tapis Rouge.

C. S. Lewis, o filósofo e escritor irlandês, dizia que um dentista que cura a dor de
dente de um homem faz mais pela humanidade do que alguém que elabora
meticulosamente um plano perfeito para salvar a nossa espécie.

E como temos tentado salvar a humanidade na nossa curta passagem por aqui. Mudar o mundo, limpar os oceanos, preservar as florestas; alterar padrões, concepções, comportamentos, hábitos. Todos temos abraçado missões grandiosas, principalmente se não exigir mais do que um story, um post. Entretanto, não são muitos os que estão dispostos a ser fiel no pouco, a levar um punhado de cores ao cotidiano ordinário, a transformar, antes de mais nada, o próprio entorno.

As redes sociais turbinam esse sentimento revolucionário. Muitos falam, sugerem,
opinam, enquanto poucos ouvem. E quando menos se espera, nossos dedos
rápidos e imprudentes agem promovendo discórdia gratuita entre pares por meio de
pareceres rasos sobre os mais diversos assuntos, dando vazão a uma miscelânea
de opiniões de gosto e graça muitas vezes duvidosos.

Dentro ou fora das telas, todos temos um plano perfeito, uma solução mágica. Mas
poucos de nós se atrevem a ser o dentista de que Lewis fala, alguém que trata a
dor.

Mas eis que, em meio a tudo isso, se sobressai um movimento que não se propõe a
curar nossa alma – esqueçamos por ora as soluções em definitivo – mas que torna o
jugo mais leve e a nossa caminhada mais prazenteira. Um átimo de carne e osso e
muito coração, materializado no lançamento do livro “O Tempo em Camadas”, de
Ângela Barros Leal, que aconteceu no último dia 24 de outubro. O livro é um conjunto de crônicas originalmente publicadas pelo Focus.jor.

Um encontro de pessoas das mais variadas matizes e correntes de pensamento,
unidas pelo propósito de ouvir, refletir e contemplar. Algo raro na
contemporaneidade. Ali não havia qualquer pretensão de subverter e estabelecer
novos parâmetros, mas talvez de encontrar-se mais e firmar mais a própria
identidade. Se houve um mundo a ser mudado naquela noite foi o universo de cada
um, a partir da experiência segundo a própria existência.

Algo raro em meio ao corre-corre, ao ruge-ruge nosso de cada dia: música, bom
papo e literatura com o fim em si mesmo, uma ode à contemplação que agrada aos
olhos não só pela beleza, mas porque transmite significados e valores que nos são
relevantes e que desejamos conscientemente expressar. Simples assim.

Foi o conselho de Polônio a Laertes, em Hamlet, bem aplicado durante as
exposições. Ouvidos emprestados à exaustão e vozes guardadas para a hora
adequada.

Houve coral trazendo Fagner, Ednardo e Belchior à baila; houve os anfitriões, Amarílio e
Patrícia, recebendo a todos com imenso carinho e leveza; houve muitos autógrafos.
Houve encontros dos que sempre se veem e dos que a vida separa sorrateiramente.

Houve também brincadeiras e troça entre alvinegros e tricolores, em função do
momento e, principalmente, do vinho.

Por falar em cores, todos presenciaram um raro caso de paredes que expandiam
em vez de cumprir a função primeira de delimitar. Ornadas com obras de arte
diversas, as paredes nos transportavam para fora da nossa realidade comezinha, tal
qual o guarda-roupa do nosso Lewis, a porta para Nárnia. Que honra, ademais, ter
como espectadores artistas consagrados pendurados nas paredes.

Algum tipo de ação de marketing? Não sejamos utilitaristas. Mas o que isso muda?
Não sejamos deterministas. O que estava ali era o que ali se via. Um lapso. Um
instante, uma pausa.

Nas mãos dos convidados, havia mais que um livro, mas fragmentos de existência
coletados semanalmente. É preciso dizer que escrever é um ato de coragem,
sobretudo quando se está sob escrutínio permanente. Escrever é expor para todo o
sempre aquilo que poderia estar guardado para si, sem risco algum, sem qualquer
medo de trazer à tona o retrato que temos de nós mesmos escondido em um velho
porão. Um compilado de crônicas nunca é apenas um livro.

Se a Ângela Barros se sentiu confortável para fazê-lo foi porque encontrou terreno
fértil para tanto. Sorte nossa ter essa viagem a reflexões e reminiscências
proporcionada pelo empresário Paulo Porto, que financiou a impressão da obra. Que essas iniciativas se multipliquem.

E que sigam assim, singelas, silenciosas, despretensiosas e generosas com a alma
humana.

É preciso mais estímulos dessa grandeza no mundo exterior para que façamos a
nossa parte, refletir e olhar para dentro, voltar-se para si. Se pensarmos bem, a
transformação que a humanidade tanto anseia não está tão longe, está em nós.

Pádua Sampaio é publicitário, empresário, professor e colaborador do Focus.jor, no qual assina artigo às quintas-feiras.

 

 

 

 

 

Veja algumas imagens do lançamento do Livro O Tempo em Camadas

 

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