O país cresce acima das expectativas preliminares dos agentes de mercado, a inflação late mas não morde e o desemprego atinge o piso recorde de 6%.
Dito assim, seria, na Bélgica ou qualquer outro país do mundo desenvolvido, o retrato falado de um governo de larga popularidade a caminho de sua reeleição.
Pois é. Mas é o Brasil, onde o buraco não apenas é mais embaixo como não tem fundo: um país com impostos suecos e serviços sociais colombianos.
Se dá, portanto, que, a meio mandato de seu governo, o presidente Lula emite sinais de que pretende ampliar a área do puxadinho liberal de sua base política para, adiante, renovar seu contrato com os eleitores com apoios regionais mais amplos.
Há problemas com preços de produtos básicos. Há o repuxo do dólar ao patamar inquietante de seis reais. Há pressão sobre os limites fiscais. Há um congresso conservador. Há o crime organizado e outra centena de mazelas crônicas pedindo a presença da ambulância (ou da viatura) do Estado.
Mas há também, bordejando esses desafiadores fatores de primeira ordem, a percepção de que Lula 3.0 mobiliza menos o sentimento das ruas e que o pensamento conservador se alarga sobre uma base social hoje bem mais articulada – dois dados distintos da realidade, mas que guardam grande margem de interseção entre suas causas.
Lula disse, não faz muitos dias, que o governo plantou na primeira metade de seu terceiro mandato e que “agora vai colher” resultados em monta bastante para injetar mais otimismo no espírito coletivo. Quando criava vacas gordas, Lula prometia, e entregou em parte, um “espetáculo do crescimento”. Agora, modera nas metáforas.
O que é preciso dizer antes que o espaço deste artigo acabe é que o presidente tem somente mais um ano para provar o que diz. Sim, porque em 2026, ano eleitoral, não deverá contar com grande boa vontade no congresso, nem fidelidade segura de seus muitos aliados de ocasião, se não deslanchar de fato nos próximos doze meses.
A polarização persistente nos cenários levantados pelas pesquisas de opinião aglutina um bloco de governadores no Sul, Sudeste e Centro Oeste que já se pinta para a guerra porque percebe que a aura de Lula não mais projeta, tanto quanto antes, o perfil do homem que um dia fez o povo sonhar.
Enfim, a colheita que o presidente anuncia genericamente, sem oferecer nenhuma referência métrica, tem mais um ano para apresentar sua safra. Significa dizer que o desempenho no próximo ano definirá a capacidade de aglutinação de Lula em busca de um novo mandato. O ambiente de polarização não permitirá que a concertação se estenda no curso do ano eleitoral.
O presidente do PSD, Gilberto Kassab (um oráculo, erra pouco), aposta na reeleição de Lula. Inclusive, já aconselha o governador paulista Rodrigo Freitas a partir para uma reeleição tranquila em seu potentado e deixar Brasília “mais pra frente”. É uma boa referência para quem precisa enxergar o que se move na linha do horizonte.
Ricardo Alcântara é escritor, publicitário, profissional do marketing político e articulista do Focus.