
Em um mundo marcado por crises sanitárias, climáticas e tecnológicas, a ciência deveria ser o idioma comum que atravessa fronteiras. Na prática, porém, o cenário está longe disso. A ciência, que por definição é uma construção coletiva, enfrenta um paradoxo cada vez mais evidente: depende da cooperação internacional para avançar, mas sofre as consequências de disputas políticas e econômicas que limitam essa colaboração.
As sanções impostas pelos Estados Unidos têm impactos que vão muito além das fronteiras diplomáticas ou comerciais. Elas afetam diretamente o acesso de pesquisador(a)s a bancos de dados, revistas científicas, softwares e insumos laboratoriais. Em outras palavras, bloqueiam o conhecimento. E, quando o conhecimento é bloqueado, todo mundo perde.
Imagine uma cientista com resultados promissores sobre uma nova molécula antiviral — mas que não pode publicar seu artigo em uma revista internacional por conta de sanções. Ou um grupo com dados valiosos sobre o controle de doenças tropicais — que não consegue utilizar plataformas digitais para divulgar suas descobertas. Esses não são exemplos hipotéticos: são obstáculos reais, vividos diariamente por centenas de pesquisador(a)s que não têm o “passaporte certo” para circular no sistema científico global.
A ciência precisa de pluralidade, porque é justamente na diversidade de contextos, experiências e realidades que nascem as inovações mais relevantes. Um mundo onde apenas alguns países têm voz no debate científico é um mundo menos criativo, menos justo e menos preparado para enfrentar seus próprios desafios.
Não se trata de ignorar as complexidades geopolíticas, mas de reconhecer que o conhecimento não deve ser arma de guerra nem ferramenta de exclusão. A pandemia nos mostrou que fronteiras não seguram vírus. E a crise climática escancara que o colapso ambiental não respeita tratados diplomáticos.
Se queremos uma ciência capaz de responder aos desafios do presente e do futuro, precisamos, com urgência, de políticas que favoreçam a inclusão, o diálogo e a troca. A ciência não pode ser refém de interesses geopolíticos. O laboratório precisa ser mais poderoso que o gabinete.
Porque no fim das contas, ou avançamos junto(a)s, ou regredimos todo(a)s.
Adriana Rolim é Farmacêutica, Doutora em Farmacologia. Docente e Pesquisadora da Universidade de Fortaleza.