
O fato: O Supremo Tribunal Federal (STF) caminha para firmar uma das decisões mais impactantes sobre liberdade de expressão e regulação digital no país. Na próxima quarta-feira (25), o plenário retoma o julgamento que discute se empresas de redes sociais podem ser civilmente responsabilizadas por publicações ilegais feitas por seus usuários — como conteúdos racistas, homofóbicos, misóginos, de incitação ao ódio ou antidemocráticos.
A maioria já está formada: 7 dos 11 ministros votaram para permitir a responsabilização das plataformas, mesmo na ausência de ordem judicial prévia. A mudança atinge diretamente o artigo 19 do Marco Civil da Internet, que há mais de uma década estabelece que redes sociais só podem ser responsabilizadas após descumprimento de ordem judicial. Para os ministros que já se manifestaram, o dispositivo criou uma espécie de imunidade indevida às big techs.
O que está em jogo: O julgamento vai além de um caso isolado. A decisão terá repercussão geral — ou seja, valerá como regra obrigatória para todos os tribunais brasileiros. E o impacto é amplo: envolve desde a responsabilização por conteúdos ofensivos até o papel das redes no combate à desinformação e ao discurso de ódio.
O relator Dias Toffoli, seguido por Luiz Fux, foi direto: o artigo 19 é inconstitucional. Ambos defenderam que, em vez de depender de decisão judicial, a remoção de conteúdos ilegais pode ocorrer mediante simples notificação da vítima ou de seu advogado.
O presidente do STF, Luís Roberto Barroso, endossou esse entendimento com uma ressalva: nos crimes contra a honra (como calúnia e difamação), a ordem judicial ainda seria necessária. Votos semelhantes vieram de Flávio Dino, Gilmar Mendes, Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes — este último comparando redes sociais a empresas de mídia e defendendo sua responsabilização direta pelo que é publicado.
Big techs na linha de fogo: As gigantes de tecnologia, como Google e Meta, acompanham o julgamento com atenção máxima. Representantes do setor fizeram defesa enfática da manutenção da regra atual, argumentando que monitorar previamente os conteúdos publicados pelos usuários seria censura e que as empresas já removem material ilegal por vias extrajudiciais.
A crítica central das plataformas: uma mudança no marco legal traria insegurança jurídica, aumento do número de ações judiciais e risco de cerceamento à liberdade de expressão.
Uma nova era de responsabilidade digital? O único voto contrário até agora é do ministro André Mendonça. Para ele, não se pode imputar às redes sociais responsabilidade direta pelas opiniões e manifestações de seus usuários, sob risco de comprometer o exercício da liberdade de expressão.
Ainda faltam os votos de Edson Fachin e Cármen Lúcia, mas, com maioria consolidada, o Supremo deve abrir caminho para uma reinterpretação profunda do papel das redes sociais na democracia brasileira.