Por que jornalistas devem liderar: o poder da comunicação na gestão pública e privada; Por Paulo Mota

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Em um mundo cada vez mais impactado pela velocidade da informação, pela transparência exigida pela sociedade e pela necessidade de conexão autêntica entre instituições e seus públicos, a comunicação deixou de ser apenas um apoio. Tornou-se centro estratégico da gestão.

Nesse novo cenário, profissionais com formação jornalística — por sua capacidade de escuta, análise crítica, linguagem clara e visão sistêmica — estão mais do que aptos a ocupar posições de liderança tanto nas esferas públicas quanto privadas.

Da redação ao Palácio da Abolição

Durante uma reunião com assessores de comunicação do Governo do Estado, no Palácio da Abolição, reencontrei meu colega dos tempos da TV Jangadeiro, Chagas Vieira. Hoje à frente da Casa Civil, Chagas é um exemplo de como o trânsito entre o jornalismo e a gestão pública pode fortalecer a estratégia institucional.

Com sua experiência e sensibilidade política, destacou o papel da comunicação como elo entre governo e sociedade, lembrando que, na era digital, o silêncio é uma armadilha e a comunicação malfeita pode comprometer projetos inteiros.

Tendências que confirmam o movimento

Essa ideia ecoa as conclusões do estudo Aberje Trends 2024, que aponta a comunicação interna e institucional como áreas em crescimento estratégico dentro das organizações.

Segundo o relatório, há uma valorização crescente de profissionais que consigam articular narrativas relevantes, construir reputação e gerir crises em ambientes complexos. Nesse ponto, jornalistas trazem uma bagagem preciosa: sabem identificar o que é relevante, entendem os fluxos informacionais e têm compromisso com a clareza e a veracidade.

Comunicação como política pública

A comunicação não é — e nunca foi — neutra. Ela influencia percepções, molda decisões e pode ser aliada fundamental de políticas públicas transformadoras.

No início do primeiro governo Lula, o cantor e escritor Chico Buarque sugeriu a criação simbólica do “Ministério do Vai Dar Merda” — uma forma espirituosa de lembrar ao novo governo da importância de prever e mitigar riscos de comunicação.

Coincidência ou não, Lula convocou o jornalista Franklin Martins para comandar a Secretaria de Comunicação Social. O resultado foi notável: a comunicação institucional ganhou força, a popularidade do presidente aumentou e a gestão ganhou estabilidade e apoio político suficiente para a reeleição e a eleição de sua sucessora.

Experiência prática: comunicação desde a origem

Nos 10 anos que trabalhei no Banco do Nordeste, uma das minhas bandeiras era colocar um profissional de comunicação desde o início do processo de geração de um produto. Quando isso acontecia, a possibilidade de sucesso era maior e evitávamos correr atrás do prejuízo.

Lembro também de uma contribuição que demos para ajudar Franklin Martins a mudar os rumos da comunicação e do governo Lula. A partir de uma ideia surgida num papo com o saudoso publicitário Orlando Mota, que atendia o Banco do Nordeste, criamos o programa “Minuto Conterrâneo”, que trazia histórias reais de clientes que mudaram suas vidas a partir do crédito ofertado pelo banco.

Lula gostou tanto daquilo que pediu que as áreas de comunicação de todas as estatais se reunissem para ver nossa experiência e se inspirar. Eu e Orlando tomamos um porre para comemorar o feito.

Liderança com escuta e repertório

Jornalistas também são, por natureza, bons ouvintes. Essa qualidade se torna essencial quando se trata de liderar equipes, dialogar com stakeholders e tomar decisões em ambientes de alta exposição pública.

O jornalista que assume posição de gestão não abandona sua essência investigativa — apenas a amplia com responsabilidade institucional, capacidade de mediação e visão sistêmica.

Jornalistas também no setor privado

Na iniciativa privada, o movimento é semelhante: empresas que investem em comunicação como valor estratégico tendem a fortalecer sua reputação, prevenir crises e se conectar com profundidade a consumidores, colaboradores e investidores.

E, nesse contexto, cada vez mais jornalistas têm assumido diretorias de comunicação, presidências de conselhos e até cargos de CEO em empresas inovadoras.

Conclusão: protagonismo necessário

Num tempo em que a desinformação circula com mais rapidez do que os fatos e em que a credibilidade é um dos ativos mais valiosos, é imperativo que as organizações — públicas e privadas — valorizem lideranças com base ética, repertório cultural e compromisso com o interesse coletivo.

Formados para lidar com a complexidade do mundo real, jornalistas estão prontos para liderar. Basta que as estruturas de poder reconheçam esse potencial — e que os próprios jornalistas se vejam como protagonistas, não apenas como contadores de histórias, mas como construtores de futuros.

Fonte:

Paulo Mota é mestre em Comunicação e Semiótica pela PUC-SP, especialista em Comunicação Estratégica, Projetos Culturais e Gestão Pública. Ex-Folha de S.Paulo, El País e Banco do Nordeste. Atualmente, é Gerente de Comunicação e Marketing da Companhia de Gás do Ceará.

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