Ciro 2026: Vai encarar? Por Ricardo Alcântara

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Ciro Gomes tira uma selfie: trajetória dividida entre a cabeça e o fígado.

Aguardava por referências mais objetivas, as pesquisas de opinião, para comentar a possível candidatura de Ciro Gomes ao governo do Ceará em 2026, mas as poucas sondagens divulgadas, de abrangência limitada, não trouxeram nada além daquilo que já se poderia supor com base somente nos fatores já postos.

Em resumo, é possível dizer que o candidato – personagem – é forte, consistente sob vários aspectos, mas a candidatura – seu enredo – tem problemas de complexidade a superar.

Ciro é um presidenciável, nome de expressão nacional, apesar dos resultados eleitorais recentes, módicos. Segundo a lei da gravidade política, um pouso de sua figura na cena eleitoral mais restrita da disputa estadual tem peso próprio. Em miúdos: não é um Roberto Cláudio, por exemplo.

Contudo, a engenharia de sua candidatura tende a deixar vestígios grosseiros de montagem. Metaforicamente, o figurino não combina com a cenografia. Nas três últimas décadas, Ciro atuou como um loquaz arauto de centro esquerda. Sua presença num palanque bolsonarista seria como um astronauta numa cena de cavalaria medieval. O problema pode ser resumido no comentário que um político sensato fez a ele: “essa estória de ficar trocando de torcida não costuma dar certo”.

A aliança ensaiada entre Ciro Gomes e o bolsonarismo raiz do PL cearense é tão vulnerável ao assédio crítico – viviam aos tapas, nunca aos beijos – que o candidato se arrisca a ver sua campanha tragada em grande parte para o lodo movediço da discussão inconveniente sobre coerência e, como se sabe, candidato que não consegue pautar eleição – ao contrário , é pautado pelo adversário – naufraga antes de avistar a praia.

Ainda que vencida essa dificuldade (na hipótese otimista em que os extremistas da direita se comportem como cordeiros pacatos e aceitem a reiteração de algumas críticas passadas) e suas divisões cheguem vivas à murada da fortaleza governista, Ciro teria diante de si um desafio ainda maior: derrotar um governador com 71% de aprovação popular.

É sabido que uma campanha tem caráter plebiscitário quando o governador atual é candidato à reeleição. Mesmo considerando o fato posto de que Elmano não construiu a partir do cargo uma moldura carismática, somente em conjuntura extraordinária um governante bem avaliado desce do cavalo selado (vídeo Lúcio Alcântara em 2006) para dar montaria ao opositor.

A situação de Elmano de Freitas, estribado no apoio de lideranças de expressão e numa frente de prefeitos de larga amplitude, não sugere um cenário vulnerável a aventuras. O governo pode muito. Num estado pobre, onde há poucos municípios com economia de perfil autônomo na sua capacidade de oferecer empregos e bancar investimentos, o governo pode muito mais. As sombras dos velhos feudos e seus modos senhoriais ainda não se apagaram nas relações sociais do semi árido.

Ciro sabe disso tudo. Com sua capacidade cognitiva em perfeitas condições de uso, o que nem sempre ocorre, tem a medida exata do desafio que insinua desejar. E sabe também: uma derrota em casa seria game over. Tudo depende de saber qual órgão do seu corpo terá a prerrogativa de decidir: a cabeça ou o fígado.

Ricardo Alcântara é escritor, publicitário, profissional do marketing político e articulista do Focus.

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